Skip to main content

Posts

Showing posts from May, 2019

Poesia: Cavalos de Murilo Mendes

Foto minha: Cavalo na Janela Cavalos  Murilo Mendes Pela grande campina deserta passam os cavalos a galope. Aonde vão eles? Vão buscar a cabeça do delfim rolando na escadaria. Os cavalos nervosos sacodem no ar longas crinas azuis. Um segura nos dentes a branca atriz morta que retirou das águas, Outros levam mensagens do vento aos exploradores desaparecidos, Ou carregam trigo para as populações abandonadas pelos chefes. Os finos cavalos azuis relincham para os aviões E batem a terra dura com os cascos reluzentes. São os restos de uma antiga raça companheira do homem Que os vão substituir pelos cavalos mecânicos E atirá-los ao abismo da história. Os impacientes cavalos azuis fecham a curva do horizonte, Despertando clarins na manhã.

De balbúrdia em balbúrdia I

    Ano 2000. Lembro dos professores de história e matemática explicando que, ao contrário do que as pessoas tinham declarado para programas de televisão durante as festas de  reveillon, nós não estávamos iniciando um novo milênio. Nosso mundo ocidental começou a contagem no Ano Domini , ou seja, no ano do nascimento de Cristo. Aquele foi o 1, não tivemos um ano zero. Por isso, só completaríamos  o milênio quando acabasse o dia 31 de dezembro de 2000. E foi essa a inspiração da camiseta comemorativa do nosso terceirão. De um tecido azul celeste igual ao da camisa do Cruzeiro, saltava em letras garrafais o título  "Os últimos do milênio!".        Nós, "os últimos do milênio", fomos os primeiros a cursar o Ensino Médio ao invés de Científico e muitos de nossos professores confessavam que não sabiam muito bem o que isto significava. Também participamos de uma das primeiras edições do Exame Nacional do Ensino Médio, o ENEM. Sobre ele, aliás, líamos notícias confli

A velha sonata do absoluto de Machado de Assis

Desenho de Georgia O'Keefe, foto minha Um experimento: fazer da prosa de  Machado de Assis a poesia que Machado de Assis nunca faria e ilustrá-la com desenhos à lápis de Georgia O'Keefe. Projeto de distração fuleira no meio de uma tempestade épica em Oklahoma às 4 da manhã. Sonata do Absoluto Machado de Assis I Tinha lido de manhã,  em uma notícia de jornal,  que há estrelas duplas,  que nos parecem um só astro.  Em vez de ir dormir,  encostou-se à janela do quarto,  olhando para o céu,  a ver se descobria alguma delas;  baldado esforço.  Não a descobrindo no céu,  procurou-a em si mesma,  fechou os olhos para imaginar o fenômeno;  astronomia fácil e barata,  mas não sem risco.  Maria Regina viu dentro de si  a estrela dupla e única.  Separadas, valiam bastante;  juntas, davam um astro esplêndido.  E ela queria o astro esplêndido.  Quando abriu os olhos  e viu que o firmamento ficava tão alto, co

Poesia Ilustrada: Como Construir Catedrais e "como Inglaterra amava Irlanda"

como Inglaterra amava Irlanda “O quê foi isso? – Um sonho?” exclamou Maxim. “Ou realidade?” À essa pergunta um cartãozinho responde sarcasticamente: “Podemos afirmar, muito felizmente ... - não foi nem sonho nem realidade.” [1] Script de MMM de Eisenstein, 1932 ah eu sei que ele me ama como Inglaterra amava Irlanda curioso até os dentes ele me disseca cientificamente empenhado a ferro e fogo em me salvar de mim mesmo ah eu sei que ele me ama como Inglaterra amava Irlanda a mão direita tão doce melancólica e lírica amorosamente triste vertendo lágrimas argentinas de puro mercúrio a esquerda tão despótica inflexível, implacável, garras afiadas de chumbo em penca olhos duros de estanho ah eu sei que ele me ama como Inglaterra amava Irlanda seu amor é pura posse avalanche densa e profunda que tange os meus ossos e tritura meus gritos de socorro quem me ouve não me acode e ajudar quem quer nã

Recordar é viver: refugiados e xenofobia

--> Robert Reynolds Num discurso feito na “American Defense Society” em maio de 1939 no hotel Astor na cidade de Nova Iorque, o senador pela Carolina do Norte Robert Reynolds condenou a proposta chamada Wagner-Rogers Bill , que seria derrotada no congresso pouco depois. A proposta teria permitido a entrada de 20.000 crianças refugiadas da Europa nos Estados Unidos. Para que se tenha a perspetiva exata da postura de Reynolds, há que se lembrar que a famigerada “Noite dos Cristais” tinha acontecido há apenas 6 meses. Durante a Noite dos Cristais 30.000 judeus foram mandados para campos de concentração e 267 sinagogas foram queimadas em dois dias de delírio nazista. Reynolds não representava a opinião da minoria. Uma pesquisa da Gallup naquele ano de 1939 indicava que 67% dos perguntados se opunham a receber mais refugiados da Europa. Kristallnacht Dois anos mais tarde, no dia 5 de junho de 1941, o mesmo Robert Reynolds usava a tribuna do senado para