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Showing posts from October, 2022

Exaustão 2022

  Colagem minha: democrazy Acho que o termo mais justo seria dizer que eu estou exaurido pela campanha eleitoral. Não sei de nada de substancial, de nenhum debate de ideias, que tenha acontecido esse ano. As pesquisas registram - imperfeitamente - a vontade das pessoas em votar por um dos candidatos. Um registro mudo. Por que tanta gente vota em Bolsonaro? O que leio são meras suposições, tentativas que arranjar ideias em torno dos supostos fatos, justificando-os. Mas ninguém se exaure com tanto vazio. A canseira vem da avalanche diária de absurdos. Em ordem aleatória, puxando pela memória: - Briga e tumulto na festa de Aparecida e casos de gente até alvejada por tiros durante cultos; - Empresas ameaçando demissão ou dando descontos para quem vota no atual presidente; - Um coordenador de campanha recebendo com tiros de fuzil e granadas a visita da polícia federal e depois o candidato negando sequer conhecer pessoalmente o sujeito; - Fantasias sexuais perversas envolvendo menores de ida

Poesia minha: Conto de Fadas

Eu me lembro daquela noite em que me deitei acordado no vagão mal iluminado, num terno êxtase de agitação a maçã do meu rosto queimando o frio impecável da fronha  e o coração batendo com os pistões  da locomotiva que puxava o trem e me levava noite afora para longe de Belo Horizonte para longe da minha infância para longe da calma caiada  da casa da minha mãe, para o país desconhecido da vida adulta para nunca mais voltar.                                                                                                   Eu imaginava minha mãe passando a vista cansada em tudo o que eu deixei para trás no quarto que não era mais meu numa caixa de papelão pardo dormindo, cobrindo-se de pó debaixo da cama estreita. Da minha mão as curvas macias de um seixo, dos ouvidos o ressonar de veludo do vento, dos olhos o amarelado pesado da lua prenha, da boca o hálito da fome, das narinas o cheiro do couro curtido  no assento do trem, do coração o rugido sincopado do trem. Eu tinha 15 anos quando c

Livros que eu amo: Oliver Twist de Charles Dickens

Charles Dickens teve sucesso extraordinário com Pickwick Papers,  um romance satírico, conseguindo finalmente afastar de si a sombra tenebrosa da pobreza que tinha marcado grande parte da sua infância e adolescência.  No meio do século XIX, um romance era muito mais que um livro vendido em livrarias: saía primeiro serializado em algum jornal ou revista e era adaptado para o teatro em forma simplificada, atingindo um público imenso - contam que no seu auge um romance novo de Dickens aparecia em 20 produções teatrais distintas só em Londres!  Ao contrário de muitos outros artistas, Dickens não tentou repetir a fórmula do sucesso dos Pickwick Papers no seu projeto seguinte .  Em 1838, Dickens publicou um livro que misturava em partes iguais comédia e drama e que tinha um alvo social bem claro:  Oliver Twist. O alvo do livro era o primeiro sistema de bem-estar social da Inglaterra industrializada, que tratava os pobres com disciplina vitoriana implacável em casas de confinamento com trabal

Confissão

Desenho meu: Auto-Retrato  Essa semana aconteceu uma coisa chata comigo. Eu resolvi usar uma camiseta um pouquinho mais apertada e alguém chamou atenção para minha barriga, várias vezes em sequência, já que eu tinha ignorado o primeiro e o segundo comentário. Banal, trivial, rotineiro. Mas está doendo, fundo, até agora. Como é de costume, essa é uma daquelas dores que vem de muito longe.  Dizem que um apelido é um gesto de aproximação. Quando eu era criança já quase adolescente, eu era rotineiramente chamado de "Baleia" e num certo momento quiseram também me chamar de "Rapariga". A intenção por trás desses dois apelidos "carinhosos" qual seria? Fazer uma aproximação agressiva? Talvez me transformar numa coisa ruim, fraca, ridícula, abjeta. Chamar a atenção para o que eu tinha/era que incomodava as pessoas à minha volta. A razão para essa agressividade era meu corpo e minha maneira de falar, meus gestos, minha voz, meu sotaque talvez. Coisas que são difícei

Edgar Morin

Desenho Meu Mistério  [Edgar Morin] A Realidade se esconde atrás de nossas realidades.  O espírito humano se encontra às portas do Mistério.   

Poema: Drummond

 Nos momentos difíceis, como este em que temos que aceitar que 50 milhões de brasileiros ainda escolhem votar em Jair Bolsonaro depois de 4 anos de pesadelo, eu me agarro naqueles poemas que Carlos Drummond de Andrade escreveu numa época muito mais dura do que essa. Entre 1935 e 1945, as pessoas tiveram que encarar nada menos que o Estado Novo, Franco, Hitler, Mussolini, o império japonês e a Segunda Guerra Mundial. Compartilho aqui um deles:  Foto minha: Caderno de notas