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Showing posts from February, 2021

Prata Preta e Cruz e Souza

Vida Obscura Cruz e Souza Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro, Ó ser humilde entre os humildes seres. Embriagado, tonto dos prazeres, O mundo para ti foi negro e duro. Atravessaste num silêncio escuro A vida presa a trágicos deveres E chagaste ao saber de altos saberes Tornando-te mais simples e mais puro. Ninguém te viu o sentimento inquieto, Magoado, oculto e aterrador, secreto. Que o coração te apunhalou no mundo. Mas eu que sempre te segui os passos Sei que cruz infernal prendeu-te os braços E o teu suspiro como foi profundo! "... para não andarem dizendo que o povo é carneiro. De vez em quando é bom a negrada mostrar que sabe morrer como homem! [...] ... mostrar ao governo que ele não põe o pé no pescoço do povo".  Depoimento dado por cidadão anônimo sobre a Revolta da Vacina recolhido pelo jornal A Tribuna  ainda em 1904. Caricatura de Horacio José da Silva, estivador e capoerista conhecido como Prata Preta, líder das barricadas no bairro da Saúde no Rio de Janeiro em

Coisas que eu vou ter que ler e ouvir pelo resto da vida

1. Rui Barbosa não queimou arquivos sobre a escravidão no Brasil para apagar a memória sobre a instituição. Ele de fato mandou queimar arquivos, mas para acabar com a pressão de ex-escravistas que queriam ser ressarcidos pelas suas "perdas" com a abolição. 2. O homem cordial de Raízes do Brasil  não é um sujeito gentil e bonzinho. A coisa mais interessante desse primeira obra de Sergio Buarque de Holanda é que ela não é nem ufanista nem apocalíptica.   3. Se Graciliano Ramos, Guimarães Rosa e Clarice Lispector são Modernistas (no sentido extra-ambíguo que a palavra tem no português, pelo menos no Brasil), então Machado de Assis, Cruz e Souza e Lima Barreto também o são.  4. Os corruptos em geral não vão para a cadeia nos EUA e, se vão, não esquentam o assento muito tempo por lá. O sistema político é profundamente corrompido pelo dinheiro que financia todas as campanhas políticas aqui.   5. Toda obra literária de excelência é, ao mesmo tempo, profundamente local e universa

O que não está nos autos não está no mundo - Notas sobre a lei, a repressão e a religião no Brasil

No dia 11 de outubro 1890 a recém-criada República institui um novo Código Penal onde consta a possibilidade de reprimir falsas curas e mau espiritismo. Ao invés de negar a existência da magia, as instituições incentivam a população a denunciar os praticantes de magia "negra" ou feitiçaria. Dizia o artigo 157: "Praticar o espiritismo, a magia e seus sortilégios, usar de talismãs e cartomancias para despertar sentimentos de ódio e amor, inculcar curas de moléstias curáveis ou incuráveis, enfim para fascinar e subjugar a credulidade pública".  Seguindo Foucault, digamos a partir daí se inscreve no mundo da lei, a magia. Começa a luta pela assimilação espiritual do Afro no Brasil. Se a escravidão assimilava o africano ao mundo colonial através do chicote e da cachaça, a polícia vai assimilar o africano ao mundo brasileiro através da batida policial e da lista de instituições reconhecidas como de práticas "elevadas e honestas" (embranquecidas).  "Trabalho

Viva la mídia loca: feice

Tarefa: garimpar FCBK. Um indivíduo começa chamando Biden de "bidê" e o chamando de comunista - passo correndo para frente. Vejo umas coisas interessantes que compartilho na página de português da minha universidade. Duas pessoas começam um diálogo de surdos porque uma delas disse que os animais não eram irracionais - vamos em frente. Vejo mais umas coisas interessantes que compartilho na página de português da minha universidade. Alguém chamado João Guimarães Rosa anuncia 19 poemas de Guimarães Rosa do "Ave, Palavra!". Como é que o próprio volta do mundo dos mortos desconhecendo que seu próprio livro "Ave, Palavra!" era de crônicas? Fico com preguiça de investigar o mistério e sigo em frente. Vejo mais umas coisas interessantes que compartilho na página de português da minha universidade. Fim da tarefa. 

Resenha relâmpago: Growing Things and other stories de Paul Tremblay

 Acabei de ler Growing Things and other stories de Paul Tremblay. Mais de 400 páginas de contos de terror, muitos deles muito bons na minha opinião.  Dos contos de stalkers maníacos, adorei "Nineteen Snapshots of Dennisport" e "The Thirteenth Temple" e não gostei do interminável "Notes from Dog Walkers" [uma ideia interessante e uma execução equivocada - algo como uma boa sacada para um curta metragem sendo usada para um filme de duas horas]. Dos contos de monstros, adorei "Swim Wants to Know If It's Bad As Swim Thinks", "Our Town's Monster", "The Society of Monsterhood" e "Her Red Right Hand". Paul Tremblay evidentemente é muito bom com monstros. Dos apocalípticos, adorei "Growing Things" (quem já teve bambu em casa vai entender perfeitamente) e "The Thirteenth Temple" E os mais assustadores de todos, de longe, foram "The Teacher" e "It Won't Go Away". Eu acho que

Commonplace Book 4

"... a intolerância em ideias politicas ou religiosas é odiosa; em matérias cientificas é ridícula". Alexandre Herculano, 1847 Gonçalves Dias, abril de 1849: "Tenho me convencido, meu Teófilo, que a vida de literato no Brasil, é ora para quem tem dinheiro, quem não o tiver, faz bem em vender-se a um jornalista; ora eu não me deixo vender. Poesias, entre nós, não rendem". Gonçalves Dias, agosto de 1849 "... essa gente que se dá comigo não sabe que independência eu tenho na minha vida, nos meus atos e nas minhas opiniões". "Se vamos à essência da nossa formação, veremos que na realidade nos constituímos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros; mais tarde ouro e diamantes; depois, algodão, e em seguida café, para o comércio europeu. Nada mais que isso". Caio Prado Jr., 1942 “Quanto maior o entrechoque de versões contraditórias, maior o resíduo objetivamente verificável”. Octavio Frias