Esse texto é uma homenagem aos milhares de livrinhos fininhos que se propõem a explicar em 50 páginas qualquer coisa, do Marxismo ao machismo e de Bakhtin a Bakunin:
Uma gota de fenomenologia
Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele pôr muito reparo no caboclo e na mãe dele. O que geralmente atrapalha o médico é que ele geralmente acha que sabe mais da fome do caboclo que o próprio caboclo e a mãe do caboclo e por isso ele não presta atenção nos dois e por isso ele acaba que sabe de uma fome que é igual à fome que qualquer outro médico em qualquer outro hospital sabe. Mais longe ainda que esse médico fica o jornalista que aparece do nada na porta do hospital para ver e falar com o caboclo e a mãe dele e o médico para depois escrever sobre eles no jornal. O jornalista é geralmente pior só porque geralmente ele acha que já sabe o que o caboclo, a mãe dele e o médico sabem e que por isso sabe mais que eles todos. Agora, a pior raça mesmo de todas é a do fé-da-puta que vem escrever sobre a história da fome do caboclo, da mãe do caboclo, do médico e do jornalista porque esse já ficou tão longe, mas tão longe, que o que ele escreve ainda parece ser mas já não tem quase nada que ver com aquela fome do caboclo: o que ele escreve é essa tal de literatura.
PS. Não custa lembrar que se a fome passar nem o caboclo sabe mais a mesma coisa que sabia quando passava fome. O que ele tem depois que a fome passa e só uma idéia (mais uma) do que era a fome que ele um dia passou. Quando ele pára de passar fome e ainda acha que sabe o que é passar fome do mesmo jeito que o outro caboclo que ainda passa fome ele arrisca pretensão quase tão grande quanto a do médico, do jornalista e do bosta do escritor.
Uma gota de fenomenologia
Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele pôr muito reparo no caboclo e na mãe dele. O que geralmente atrapalha o médico é que ele geralmente acha que sabe mais da fome do caboclo que o próprio caboclo e a mãe do caboclo e por isso ele não presta atenção nos dois e por isso ele acaba que sabe de uma fome que é igual à fome que qualquer outro médico em qualquer outro hospital sabe. Mais longe ainda que esse médico fica o jornalista que aparece do nada na porta do hospital para ver e falar com o caboclo e a mãe dele e o médico para depois escrever sobre eles no jornal. O jornalista é geralmente pior só porque geralmente ele acha que já sabe o que o caboclo, a mãe dele e o médico sabem e que por isso sabe mais que eles todos. Agora, a pior raça mesmo de todas é a do fé-da-puta que vem escrever sobre a história da fome do caboclo, da mãe do caboclo, do médico e do jornalista porque esse já ficou tão longe, mas tão longe, que o que ele escreve ainda parece ser mas já não tem quase nada que ver com aquela fome do caboclo: o que ele escreve é essa tal de literatura.
PS. Não custa lembrar que se a fome passar nem o caboclo sabe mais a mesma coisa que sabia quando passava fome. O que ele tem depois que a fome passa e só uma idéia (mais uma) do que era a fome que ele um dia passou. Quando ele pára de passar fome e ainda acha que sabe o que é passar fome do mesmo jeito que o outro caboclo que ainda passa fome ele arrisca pretensão quase tão grande quanto a do médico, do jornalista e do bosta do escritor.
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Uma coisa é a realidade. Outra coisa, a Literatura. A literatura não quer reproduzir o real, mas apenas imitar o real: representá-lo. Você sabe o que é isso, seu jumento pretensioso?!