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Poesia Minha - Mash-Up

Mash-up – Cláudia Roquette-Pinto

Desde o centro, corpo adentro

dorme a explicação nos intervalos

entre lençóis de cal.

Emerge dum mar de águas anuladas

um dois pontos insólito,

espaçado, desatento:

uma idéia em combustão

deitada em dunas de pólvora;

um botão incipiente,

um fogo contido

no recorte da janela.

Mais tarde,

sob o fermento do sol,

sem margem de manobra,

com a lucidez estranha da vidraça

que a pedra acaba de acertar,

procuro me perdendo em coisas

que nos outros são migalhas.

No assédio de tudo que me toca,

sob o tampo da tarde que estupora,

emerge dum mar cachorro imenso,

vomitando espuma de bile,

a centopéia de carros

que se arrasta para dentro do viaduto.

A noite verte olhos de amoroso

interesse. Desabotoa

entre os meus dedos

as pálpebras de cobre.

Entre o vão das costelas

vejo as listras do tigre

aflorando do mergulho

na cortina de bambus.

Deste odre enganador

ou dessa vidraça alguma

coisa se debruça:

despenca ladeira abaixo

uma paisagem mental semente

do poema morte.

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