O Cinco de Mayo virou um grande evento nos Estados Unidos, mais ou menos como se fosse um St. Patrick's Day para os Chicanos. Suponho que como andam importando o Halloween e mesmo St. Patrick's para o Brasil, não tardam a importar o Cinco de Mayo também - os restaurantes de comida supostamente mexicana que eu conheci em Belo Horizonte eram "puro gringo", não digo tipo Taco Bell mas pelo menos como a cadeia Chili's. O fato é que as pessoas gostam de festas, gostam de se divertir, gostam de arrumar desculpas para entornar cerveja preta ou tequila e dançar e se agarrar e não vou ser eu que vou ficar bancando o estraga-prazeres. Deixa o povo brincar. Mas não custa aproveitar a data para uma sessão proverbial de "recordar é viver" e para aprender um pouquinho sobre história mexicana.
Para quem não sabe, depois de ser esculachado pelos Estados
Unidos e perder metade do seu território antes de completar trinta anos de
conturbada independência, o porto
principal do México foi bloqueado por uma força naval conjunta de espanhóis,
ingleses e franceses depois que o presidente Benito Juárez decretou a moratoria
da dívida externa do México em 1861. Os franceses, cheios de empáfia e vondade de se
consolidar como império global, resolveram ficar, invadir o México inteiro e ainda trazer um
príncipe austríaco [primo de Dom Pedro II] para ser imperador do México, com o
apoio da igreja católica e dos conservadores mexicanos furiosos com o estado laico e liberal preconizado por Juárez. Com muito custo, com
muito sangue, com muita coragem, os mexicanos liderados por Benito Juárez lutaram anos até
botar os franceses para correr e fuzilar Maximiliano.
O cinco de maio comemora uma vitória significativa [mas não
determinante] dos mexicanos contra aquele que era considerado o melhor exército
do mundo na época. A batalha de Puebla aconteceu antes da chegada de
Maximiliano ao trono. No México é mais uma festa no estado de Puebla e não tem nada a ver com independência, mas poderia ser uma
oportunidade para que o resto da América Latina agradecesse aos mexicanos e
especialmente Benito Juárez [que virou herói republicano ou vilão mexicano
dependendo do país e que, ainda por cima, era de origem indígena] e deu nome a todos os Juarezes brasileiros e [infelizmente]
a um certo Benito Mussolini. Graças a Benito Juárez a América Latina não foi
re-colonizada à maneira da África no século XIX, repartida entre potências
européias em colônias e protetorados e estados de mentirinha.
Em homenagem a Juárez muitos fizeram versos, entre eles, Fagundes
Varela:
VERSOS
SOLTOS
Ao
General Juarez
Juarez!
Juarez! Quando as idades,
Fachos de
luz que a tirania espancam,
Passarem
desvendando sobre a terra
As
verdades que a sombra escurecia;
Quando
soar no firmamento esplêndido
O
julgamento eterno;
Então
banhado do prestígio santo
Das
tradições que as epopéias criam,
Grande
como um mistério do passado,
Será teu
nome a mágica palavra
Que o
mundo falará lembrando as glórias
Da raça
mexicana!
Quem se
atreve a medir-te face a face?
Quem teu
vôo acompanha nas alturas,
Condor
soberbo que da luz nas ondas
Sacode o
orvalho das possantes asas,
E lança
um grito de desprezo infindo
Aos
milhafres rasteiros?
Que
destemido caçador dos ermos
Irá te
cativar, ave sublime,
Nessas
costas bravias e tremendas
Onde o
Grande Oceano atira as vagas
E os
vendavais sem peias atordoam
O espaço
de rugidos?
Que
sicário real, nas matas virgens,
Amplas,
sem marcos, sem batismo e data,
Te
apanhará, jaguar das soledades?...
Ah! tu
espreitas os vulcões que dormem!
Quando a
cratera encher-se, à luz vermelha
Rebentarás
nas praças!
Trarás
contigo os raios da tormenta!
Da
tormenta serás o sopro ardente!
Mas a
tormenta passará de novo
E o golfo
mexicano iluminado
Refletirá
teu vulto gigantesco.
O’águia
do porvir!
Teu nome
está gravado nos desertos
Onde pés
de mortal jamais pisaram!
Quando
pudessem deslembrá-lo os homens,
As selvas
despiriam-se de folhas,
Para
arrojá-las do tufão nas asas
As
multidões ingratas!
Como as
de um livro imenso elas compõem
Teu poema
sublime, a pluma eterna
Do
invisível destino, e não rasteira,
Mísera
pena de mundano bardo,
Nelas
traçou as indeléveis cifras
De teu
nome imortal!
Os
pastores de Puebla e de Xalisco,
As
morenas donzelas de Bergara
Cantam
teus feitos junto ao lar tranqüilo
Nas
noites perfumadas e risonhas
Da terra americana.
Os viajantes,
Que os
desertos percorrem, pensativos
Param no
cimo das erguidas serras,
Medem com
a vista o descampado imenso,
E
murmuram fitando os horizontes
Vastos,
perdidos num lençol de névoas:
Juarez!
Juarez! em toda a parte
Teu
espírito vaga!...
Falam de
ti as fontes e as montanhas,
As
ervinhas do campo e os passarinhos
Que,
abrindo as asas no azulado céu,
Como um
bando de sonhos esvoaçam.
Mas esse
nome que ameniza o canto
Do torvo
montanhês, e mais suave
Que um
suspiro de amor, parte dos lábios
Da virgem
sonhadora das campinas,
Faz
tremer o tirano que repousa
Nos
macios coxins do leito de ouro,
Como o
brado do arcanjo no infinito
Ao
fenecer dos mundos!
Deixa que
as turbas de terror escravas
Junto de
falso trono se ajoelhem!
Os
brindes e os folguedos continuam...
Mas a mão
invisível do destino
Na sala
do banquete austera escreve
O aresto
irrevogável!
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