Desenho meu |
O conservadorismo brasileiro é um animal curioso, pois
raramente mostra a sua cara. Isso dificulta sobremaneira todos os que desejam
combatê-lo além dos quintais da internet, onde um grupo pequeno de aprendizes
de Gustavo Barroso cospem seu veneno. For a daí, NENHUM político no Brasil é
contra a distribuição de renda ou a educação e a saúde públicas e TODOS eles
são contra o racismo e a injustiça social. A primeira estratégia é não fomentar
o debate; a segunda é escamotear o debate; depois vem a total perversão do
debate, que revolve invariavelmente sobre o sexo dos anjos. Para contrapor-se a
esse conservadorismo “líquido" de forma efetiva é preciso muito mais que
disposição para debater; é preciso estar sempre atento aos termos do debate que
se está travando, pois a estratégia do campo conservador é quase sempre a de
deslizar esses termos do debate para tangentes que nos levam invariavelmente a
lugar nenhum – para que assim fiquemos todos sempre na mesma, o que é o sonho
dourado de todo conservador.
Para ilustrar meu ponto vista, nada melhor que voltar ao
passado remoto. Eis aqui o meu resumo de 10 objeções levantadas no parlamento
brasileiro contra a Lei do Ventre Livre em 1871:
1.
Queremos todos acabar com a escravidão, porém
devemos fazê-lo pelo método mais seguro e conveniente, sem apelar para o
radicalismo de uma “justiça absoluta” [Perdigão Malheiros].
2.
A Lei do Ventre Livre é um atentado ao direito à
propriedade, uma vez que a mãe do escravo é propriedade do seu dono. [Andrade
Figueira]
3.
A violência da escravização não foi perpetrada
pelo fazendeiro mas sim pelo chefe tribal africano; o erro foi permitir o
tráfico de escravos e é injusto penalizar agora o proprietário do escravo.
[Visconde de Itaboraí]
4.
A indenização que o governo pagaria ao proprietário
da escrava quando a criança chegasse aos oito anos era pequena, principalmente
tendo em vista que só a metade das crianças de escravas chegava a tal idade.
[Barão da Vila da Barra, Bahia].
5.
A Lei do Ventre Livre é uma interferência
indevida que não leva em conta as forças naturais do mercado; o proprietário
ganha muito mais do que o valor estipulado pela indenização enviando o bebê a
casa dos expostos e alugando a mãe como ama de leite. Por isso, a Lei do Ventre
Livre deveria ser chamada de “Lei de Herodes”, já que provocará uma mortandade
indiscriminada de crianças indesejadas [Deputado Capanema, MG], “uma verdadeira
hecatombe de inocentes!” [Perdigão Malheiro, MG].
6.
As bases jurídicas do país seriam abaladas. É
perigoso e anti-constitucional considerar como “ingênuo” uma criança que de
fato era um “liberto”, pois apenas um filho gerado em um útero livre poderia
receber o título de “ingênuo”, que detinha direitos politicos plenos pela
constituição, ao contrário dos libertos. [Barros Cobra]
7.
Previa-se uma anarquia pelo fomento do espírito
de rebelião dos escravos, que não tinham discernimento para entender que seus
filhos tinham direito à liberdade mas não eles, resultando em “dias tristes, de
cenas criminosas, horríveis e escandalosas” [José de Alencar]
8.
A lei causaria uma terrível comoção econômica,
com a paralização do setor mais importante da economia, a agricultura, uma
queda brusca no valor das terras e das propriedades agrícolas, resultando no colapso
econômico do país. [Andrade Figueira]
9.
A falta de imparcialidade do imperador ao
manifestar-se a favor da Lei do Ventre Livre o fez perder a neutralidade que a
constituição lhe exigia; de juiz ele tornou-se portanto “um mero ditador” [José
de Alencar].
10. Como já disseram na razão No 1, somos TODOS
contra a escravidão, mas melhor seria um programa parcelado de emancipação,
favorecendo os maiores de 65 anos e um grupo selecionado de mulheres e crianças
de forma a promover o fim gradual da escravidão até o final do século XIX sem
desrespeitar o direito à propriedade. [Calmon]
Comments
1. Nós tbm não gostamos disso e tbm queremos mudar na direção que vcs propõem;
2. Mas do que vcs querem não dá pq não é prudente e não vai funcionar por forças além da meu controle;
3. Além do mais vcs estão querendo copiar soluções que não se adaptam à nossa realidade;
4. E finalmente não podemos perder de vista o ideal X, que nos faz o que somos e que será completamente esculhambado se fizermos como vcs querem.