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O lapso verbal e a guerra do Iraque

Os freqüentes foras de Bush, produto da óbvia dificuldade do presidente Americano em se expressar quando fala de improviso frequentemente trocando uma palavra por outra com pronúncia semelhante e sentido diferente, já renderam algumas coletâneas de “ditos” do presidente [George W. Bushisms: The Slate Book of Accidental Wit and Wisdom of our 43rd President, de Jacob Weisberg].
O tratamento da imprensa dado aos lapsos verbais do homem que veio do Texas varia muito de país para país. Enquanto jornais brasileiros deram grande destaque ao fato de que Bush chamara os australianos [dos últimos aliados fiéis dos americanos no Iraque] de alguma coisa próxima de “Australíacos”, o New York Times menciona o fato brevemente em reportagem sobre a visita lá nos confins do caderno internacional do jornal. Não é simplesmente uma questão de proteger a figura presidencial, uma vez que o New York Times tornou-se um crítico veemente de Bush [depois de apoiar, como aliás toda a mídia americana, a invasão iraquiana num surto de patriotismo exacerbado].
A questão é que a cobertura de política da mídia brasileira é cada vez mais parecida com o jornalismo feito por revistas de fofoca que fuçam a vida das tais celebridades em busca de fatos bizarros ou pitorescos. Será que essas coisas são tão importantes? Bush seria um presidente tão péssimo quanto é mesmo se conseguisse se expressar com eloqüencia e elegância. O que será mais relevante? As flores do jardim do palácio ou a política econômica ainda neo-liberal? As centenas de pessoas mortas em uma guerra baseada em justificativas fraudulentas ou as carecas simiescas do presidente? O corte de cabelo do presidente ou o corte das verbas públicas que aparecem no orçamento mas ficam “contingenciadas”?
É uma questão de ênfase...

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