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Showing posts from May, 2015

Sobre música e religião

Nusrat Fateh Ali Khan  (1948 – 1997) é um cantor paquistanês de Qawalli, antiga tradição sufi e expressão musical e poética maravilhosa daquele mundo muçulmano não-árabe.  Na minha vida adulta só me senti tentado a abraçar uma religião [no sentido coletivo da coisa] duas vezes: quando assisti a uma missa gospel ao vivo aqui em New Haven e quando ouço um desses concertos de Qawalli com Nusrat. Sem ofensas mas participar de uma comunidade religiosa deve ser uma chatura, então o encanto se desfaz logo. Agora a música ajuda. As missas que tive que frequentar quando passei um verão na praia na casa de um amigo, por outro lado, me vacinaram completamente contra o catolicismo - não a fé, mas a liturgia fria e chatíssima. Quem sabe uma sessão massiva de Bach numa igreja de Ouro Preto cheia de incenso e mirra? Na base daquelas musiquinhas de devoção naquele chaque-chaque de violão de acampamento, acho que o catolicismo no Brasil estaria extinto. Adoro nesses concertos a longa e lenta cons

Sobre a solidão, com uma navalha afiada

Seguindo uma sugestão certeira de um amigo mexicano no Feis, assisti no Netaflica o filme Ano Bissexto,  de 2010, quando ganhou a Camera d'Or, prêmio dado em Cannes a diretores iniciantes. Michael Rowe é um australiano que escolheu o México como casa quando tinha 23 anos, tendo estudado roteiro com Vicente Leñero, que tem no currículo vários excelentes trabalhos para cinema como O crime do Padre Amaro . O filme é fortíssimo e tem como destaque a atriz Mónica del Carmen, que se entrega ao papel muito além do que a gente espera de uma atriz de um filme qualquer. Também me chamou a atenção a fotografia e posta em cena preciosas num apartamento absolutamente ordinário na cidade do México. E o uso nada apelativo de cenas gráficas de sexo e violência. Parece que Rowe quer fazer uma trilogia sobre a solidão. Estou louco para ver o segundo filme, que já saiu,  Manto Acuifero. Aqui os trailers:

Viva la mídia loca: praticamente nada do que disseram sobre a morte de Osama bin Laden era verdade

Eis um resumo do artigo chocante que acabei de ler: Bin Laden era prisioneiro da agência paquistanesa ISI (Inter-Services Intelligence agency) em Abbottabad desde 2006. Os sauditas pagavam as contas para mantê-lo aí sem que os americanos soubessem. O  general Ashfaq Parvez Kayani, chefe das forças armadas e o general Ahmed Shuja Pasha, diretor geral do ISI  sabiam do ataque americano e trataram de fazer com que os dois helicópteros com os soldados americanos chegassem a Abbottabad atravessando o espaço aéreo paquistanês sem chamar atenção. A CIA não soube da localizacão de Osama bin Laden seguindo seus mensageiros como a Casa Branca alega desde maio de 2011, mas sim através de um alto oficial do serviço de inteligência paquistanês, que vendeu a informação por grande parte da recompensa de $25 milhões oferecidos pelos EUA pela captura de Osama bin Laden. Pinóquio perdia uma competição de nariz comprido para Obama  Amir Aziz, médico e major do exército paquistanês

Aventuras no lixão e desvarios da imaginacão

1. Ando trabalhando demais, num ritmo intenso, conjugando umas poucas horas dedicadas ao meu ofício propriamente dito e umas muitas e longas horas dedicadas a coisas chatérrimas que meu ofício agora parece exigir de mim. 2. Para respirar assisti há dois dias atrás a um episódio de uma série americana dessas famosas. Um lixo. Como McDonald's é um lixo. Um lixo que eu, de vez em quando, me permito consumir. Clarice Lispector declarou uma vez num texto curtinho, com aquela ironia séria e intensa dela, que tinha hora para tudo e que aquela era hora de lixo. Pois então. Vamos ao lixão. Com parcimônia, sem passar lá todos os dias. Mas vamos. 3. Caso policial de assassinato envolvendo múltiplas gangues em Washington DC. Uma era de negros com cara de malvado, uma de chineses com cara de malvado, uma de russos com cara de malvado e uma de latinos com cara de malvado. Duzentos profissionais altamente qualificados trabalhando sem medir horas extras ou equipamento de alta tecnologia na i

Poesia minha: São muitas as nossas possibilidades

Igreja de São José da Boa Morte em Macacu, foto de Vítor Gabriel São muitas as nossas possibilidades: No coração basta um tiro certeiro; No pescoço, uma forca bem feita; Pela boca ou pela veia, uma injeção ou um copo cheio de remédio ou de veneno. Basta um toque dum dedo num fio desencapado. Na cabeça basta um saco plástico. Basta uma lâmina afiada que corra do pulso ao antebraço. Longe dos trópicos, basta uma noite fria passada ao relento. Pode-se pular dum lugar bem alto ou cercar-se de água por todos os lados. Pode-se dormir com o motor ligado numa garagem fechada. Pode-se atirar-se na frente de um trem ou atirar barranco abaixo o próprio carro. Ou então basta seguir vivendo até que o coração pare ou os rins se estraguem. Até que venha um câncer na bexiga, no útero, no seio, no cólon, no baço, no reto, no sangue, na pele, no pulmão, na próstata, no pâncreas, nos rins, na bendita tireoide. Até que um pulmão murche o

Poesia minha: Intraduzível

Intraduzível Encerrado no claustro da leitura, flutuando entre três tristes línguas, não sinto conceito sem sentir palavra e não sinto palavra sem sentir caminho. Palavras tocando o tambor dos tímpanos até o coração sentir-se prensado na boca e caminhos que convergem ou bifurcam, dependendo do sentido do moinho que me rói de fora para dentro. Qual o sentido das palavras e caminhos que me cabem e não cabem em mim? Senso e sentido flutuando em três línguas me consomem por dentro desse claustro que me engole. Não sinto conceito sem sentir palavra e não sinto palavra sem sentir caminho. E sou, confesso, feliz.

Dois assuntos sumamente cansativos [e cheios de maiúsculas e pontos de exclamação] ou como perder tempo com nada

1. - Rará, meu time ganhou! Roró, seu time perdeu. - Ganhou roubado! - Você é chorão! - Time de favelado! - Time de veado! - Essa camisa feia eu não quero nem para limpar o chão. - Essa camisa horrorosa eu não queria nem para limpar a bunda. - Seu time é feio demais e fulano é um perna-de-pau. - Seu time é nojento e sicrano é um perna-de-pau. - É, mas nós ganhamos 13 Copas da Lagoa Funda. - Copa da Lagoa Funda não vale nada. Nós ganhamos 17 campeonatos interestelares. - Blá, blá, blá. [descamba ainda mais] Esclarecimento: tenho, sim, um time de futebol pelo qual sofro e grito e me descabelo. Isso não significa que eu me disponha a perder tempo com esse bate-boca estúpido. Batedores de Panela Diferenciados e Bolivarianos do Bradesco em cena de seu interminável "debate" 2. - Rará, ganhamos a eleição! Roró, você perdeu a eleição. - Ganharam porque o povo é burro. - Você não sabe perder. - Corrupto, vá prá Cuba. Só no Brasil mesmo que blá-blá-blá. - Golpi

Recomendação musical: Baleia

Ora, para que servem as amizades de internet? Para mim, amizade não tem que servir para nada, mas minhas amizades na internet [criadas aqui, na internet] são criadas nas afinidades de temas e na garimpagem de pedras preciosas nesse Amazonas enlameado de [des]informação. Renata Marques, além de ter um CD muito legal flutuando por aí para quem quiser ouvir e de escrever com um ouvido muito sensível para a língua portuguesa suja de capim e minério que circula por Minas Gerais, já me apresentou a poesia da irmã dela e, com grande animação, essa banda do Rio de Janeiro que eu, no meu bairrismo instintivo, pensei ser de Minas Gerais. Passo para frente, na esperança que outros se entusiasmem. O álbum deles está também disponível por aí. Casa Cairé Rego, David Rosenblint, Felipe Ventura, Gabriel Vaz, João Pessanha, Sofia Vaz Minha casa é simples, mas é forte todavia. Chove todo dia uma calma solidão. Vento que arranca dos varais uma lembrança – tudo que me alcança - era sonho, a