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Showing posts with the label Diário Anônimo

Não pode ou não quer?

Parar de trabalhar agora? Parar de comer comida merda? Parar de beber Coca-Cola TODOS os dias? Escrever dois livros? Perder 20 quilos? Fazer alongamento TODOS os dias? Terminar meu livro de ficção? Publicar minhas traduções? Trabalhar no meu jardim?

Minhas cidades

Resolvi escrever sobre "minhas cidades", inspirado por um post interessante que você pode ler aqui . Minha lista é bem menos glamurosa, admito, mas é o que temos por hoje. 1. Belo Horizonte Onde cresci e virei gente. Lá encontrei a pessoa com quem compartilhei toda a minha vida - e ela, sim, é uma belorizontina legítima. Para mim as coisas foram um pouquinho mais complicadas porque eu nasci no odiado Rio de Janeiro, filho de uma família de odiados cariocas torcedores do odioso Flamengo. Essa rejeição me marcou, mas sou belorizontino também - se eu não contasse isso aqui ninguém saberia. Lá é para onde volto todos os anos entre junho e julho. Amo os invernos secos e ensolarados de Belo Horizonte. A cidade é um lugar que eu amo e odeio ao mesmo tempo. Amo por causa de certas pessoas e certos bairros com sabor de cidade do interior e o caótico e fantástico centro. Odeio o fato de que uma cidade planejada vive desde que me conheço por gente nas mãos de um bando de piratas do tran...

Perder o chão - Encontrar o chão

 Perder o chão. Você já perdeu o chão? Perder a rosca, o caminho de casa? Eu costumava desprezar os otimistas, os que faziam mensagens de esperança e otimismo no meio do caos. Quando perdi o chão percebi, não imediatamente depois, mas depois de pastar a grama que o diabo plantou na minha vida, que aquele caos era, afinal, antes de qualquer coisa, meu. Genocídios, canalhas e gente estúpida que se mantém escrupulosamente ignorante existem, não nego. Mas suspeito que sempre existiram e continuarão existindo. Resta decidir onde investir as cada vez mais parcas energias: nessa gente miserável ou na gente outra, humana e interessante; nessa música ridícula que ocupa as telas e fones de ouvido de tanta gente ou na música que me inspira e me alegra a alma. Quando perdi o chão descobri que não dava conta de tanto lixo e ruindade. Não dava e não dou. Não dou conta desse mundo que querem me empurrar pela tela do computador. Melhor fechar as telas e ouvir Liliana Herrero: Confesión del Viento ...

Lista de 10 coisas que enchem o meu saco e passam desapercebido [eu acho]:

1. A forma como jornais na TV e no rádio fabricam um português pseudo-culto [que eu chamaria de "português curto"], e a maneira como esse monstrengo cheio de clichês, empréstimos inúteis do inglês, erros de concordância se espalha entre a gente que consome esse jornalismo, gente que geralmente se acham o supra-sumo do mundo - cem mil vezes QUALQUER outro português; 2.  A maneira como certas pessoas acham que eventos como o Oscar ou o Nobel tratam de qualidades artísticas e realmente escolhem os melhores do "mundo" [que mundo?]; 3. Os periódicos lamentos por uma suposta perda de qualidade da cultura em geral ou na música popular em particular, e a expectativa de que os meios de comunicação de massa funcionassem de acordo com critérios estéticos como guias iluminadores das massas; 4. A maneira como professores em geral são achincalhados e desvalorizados pelo governo, pela polícia, pelos pais, pelos administradores e pelos alunos enquanto algumas pessoas ficam fazendo ...

Confissão

Desenho meu: Auto-Retrato  Essa semana aconteceu uma coisa chata comigo. Eu resolvi usar uma camiseta um pouquinho mais apertada e alguém chamou atenção para minha barriga, várias vezes em sequência, já que eu tinha ignorado o primeiro e o segundo comentário. Banal, trivial, rotineiro. Mas está doendo, fundo, até agora. Como é de costume, essa é uma daquelas dores que vem de muito longe.  Dizem que um apelido é um gesto de aproximação. Quando eu era criança já quase adolescente, eu era rotineiramente chamado de "Baleia" e num certo momento quiseram também me chamar de "Rapariga". A intenção por trás desses dois apelidos "carinhosos" qual seria? Fazer uma aproximação agressiva? Talvez me transformar numa coisa ruim, fraca, ridícula, abjeta. Chamar a atenção para o que eu tinha/era que incomodava as pessoas à minha volta. A razão para essa agressividade era meu corpo e minha maneira de falar, meus gestos, minha voz, meu sotaque talvez. Coisas que são difícei...

Coronga blues no mês do desgosto

 Depois de um mês de trabalho árduo, estou na página 94 da seção principal do meu novo livro, que já conta com bem mais de 300 páginas no seu projeto original. A que custo! Acabei me enterrando numa terrível depressão da qual estou tentando sair desesperadamente antes que o semestre comece. Porque depressão para mim significa ter dificuldade de ir numa loja e falar com um vendedor antes de comprar alguma coisa ou de responder a uma mensagem rotineira qualquer. Então imaginem só eu entrando na marra numa sala de aula nesse estado. Tenho uma vontade tremenda de chutar tudo e me enterrar na cama que não pode acontecer. E assim vivo alternando noites de insônia que acabam às 6:30 da manhã com longos sonos de 16 horas cheios de pesadelos aborrecidos.  Mas terá mesmo sido o maldito livro que não acaba o culpado? Ou terá sido não ter ido [de novo] ao Brasil e assim conviver com a ideia da morte da minha mãe e dos meus laços com o lugar onde eu nasci e cresci. Terá sido a insuportável...

"O que é que falta acontecer?"

 Uma constante nesses dias tenebrosos: saber de alguma notícia nova do Brasil e pensar "o que é que falta acontecer?" Os absurdos vão acontecendo, as reações absurdas vão aparecendo, mas parece que o barco continua seguindo em frente. A última é que pela primeira vez morreram mais brasileiros do que nasceram num mesmo dia. Os mortos são chamados de "leite derramado". O leite continua sendo derramado aos borbotões. "O que é que falta acontecer?"  Aqui, na vidinha pessoal, que transcorre também com seus momentos tenebrosos, recebo mensagem da universidade onde reina, como de hábito, a truculência no trato com os estrangeiros que trabalham com vistos. A mensagem me refere a declarações do governo dos Estados Unidos que impõem restrições severas para viagens a certas partes da Europa e especifica África do Sul, Inglaterra e Brasil por causa de novas cepas do Covid-19 nesses países. Aparentemente vou passar três anos sem ir ao Brasil.  Perto da mortandade inacr...

Diário do Coronga

Foto minha: Esperança/A culpa é do povão/Menos Globo  Resolvi tirar férias do FCBK, aborrecido com algumas coisas que por lá se passaram e pela futilidade que impera em certas conversas e atitudes de lá. Talvez por isso escreverei mais aqui, mesmo sabendo do impacto reduzidíssimo. Infelizmente existe uma barreira [artificial] entre impactar e dizer algo que valha a pena ser dito. Reverbera o que coopera com a cacofonia histérica. Uma frase que se arrisque a dizer isso dessa maneira não pode reverberar. Reverbera o que reverbera a pauta do momento, e eu, em geral, não consigo/não tenho paciência/não tenho tempo para a pauta do momento. Eu escrevo assim mesmo e reverbero coisas que me interessam mesmo. Então eu percebo que não dou conta de impactar muitas pessoas. Não tenho talento, não consigo nem se quisesse e não quero de qualquer maneira. Continuo acompanhando aquelas pessoas que conseguem fazer as duas coisas, mas são poucas e em geral não estão no FCBK de qualquer maneira....

Papai Noel não existe

Tudo o que eu pedi ao Papai Noel foi um ano de paz. Um ano sem essa coisa que por aqui os eufemistas de plantão chamam de "incidente". Aquilo que eu chamo de trumpice: um ato de racismo truculento, ostensivo, uma prova de completa falta de sensibilidade para com o sofrimento dos outros, aquela famosa prepotência de quem, por sua cor e/ou sua classe, se considera o chefe de tudo por aqui e por isso pode falar o que bem entender com quem quiser.  Mas Papai Noel realmente não existe: http://www.oudaily.com/news/ou-gaylord-college-professor-uses-racial-slur-during-class-in/article_ddf0496e-4cff-11ea-9e80-fbaf7ab99bc3.html?fbclid=IwAR1Y_h1SgiOef1-7trL3oc9wZWmA2xNqMAK9MLaZAlItHzeJ_MXwJmfkqmg Uma das pixações pertinho da escola primária onde minha filha estudou  Dessa vez não dá nem para culpar um bando de alunos desmiolados, porque a trumpice saiu da boca de um professor no meio de uma aula expositiva. Um professor de jornalismo! Sentindo-se talvez pessoalmente ofendido p...

Ensaio da Mangüaça 1

Os computadores e a internet alteraram radicalmente a nossa noção de espaço, principalmente a partir dos telefones conectados às redes sociais. Sinto que sei disso melhor que pessoas mais jovens do que eu, pessoas que já nasceram dentro deste mundo. Meu quarto de dormir, provavelmente o que havia de mais íntimo na minha vida privada, tornou-se de repente ponto de contato com um público imenso. São amigos, simples conhecidos, parentes, algumas figuras de um passado distante, colegas de trabalho e de profissão e mesmo alguns completos desconhecidos que formam esse público que, de repente, tem acesso a esse meu espaço mais íntimo. E eu tenho acesso à intimidade deles - uma certa versão maquiada dessa intimidade, é claro. Cada um usa os filtros que lhe convém - alguns se desnudam ao ponto do embaraço, outros se mantém rígidos atrás de fotos hiper-coloridas de pratos de comida e bouquets de flores e sorrisos resplandecentes. Esse curto circuito entre as distâncias que se desmancham e as i...

Um fragmento de um diário

Uma pessoa amiga me mostrou em confidência esse belíssimo fragmento do seu diário. Insisti e ela permitiu que eu compartilhasse aqui o que ela escreveu, mas em anonimidade. Espero que vocês gostem tanto quanto eu. 2004 Prometo não me esconder atrás de mim mesmo. Prometo deixar no papel nada que não seja meu sangue. A onda vem e eu perco o pé, mas não me desespero. Solto o corpo e sinto o silêncio vibrar nele a paz do esquecimento. Um vento denso de água e sal balança meu corpo feito um saco plástico vazio de mim. Imagino meu esqueleto solto dançando por dentro em ondas de sangue ainda mais denso. A próxima onda chega e me puxa mais longe. Respirar me custa, me cansa subir. Devagar aos poucos tomo ar e volto para baixo d’água. Não me sinto preso. Não estou me afogando ainda, agora. Não estou vencido ainda que passe agora por mim o salva-vidas que vem ajudar alguém mais longe da praia que eu. Não peço ajuda. Não é orgulho. Estou à deriva por bem mai...