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Papai Noel não existe

Tudo o que eu pedi ao Papai Noel foi um ano de paz. Um ano sem essa coisa que por aqui os eufemistas de plantão chamam de "incidente". Aquilo que eu chamo de trumpice: um ato de racismo truculento, ostensivo, uma prova de completa falta de sensibilidade para com o sofrimento dos outros, aquela famosa prepotência de quem, por sua cor e/ou sua classe, se considera o chefe de tudo por aqui e por isso pode falar o que bem entender com quem quiser. 

Mas Papai Noel realmente não existe:

http://www.oudaily.com/news/ou-gaylord-college-professor-uses-racial-slur-during-class-in/article_ddf0496e-4cff-11ea-9e80-fbaf7ab99bc3.html?fbclid=IwAR1Y_h1SgiOef1-7trL3oc9wZWmA2xNqMAK9MLaZAlItHzeJ_MXwJmfkqmg

Uma das pixações pertinho da escola primária onde minha filha estudou 
Dessa vez não dá nem para culpar um bando de alunos desmiolados, porque a trumpice saiu da boca de um professor no meio de uma aula expositiva. Um professor de jornalismo! Sentindo-se talvez pessoalmente ofendido pela recente emergência da expressão "Ok, Boomer," ele resolveu dar sua contribuição ao clima péssimo da universidade no tocante às relações raciais. Isso vindo da parte de um membro de uma geração que produziu frases como "Nunca confie em ninguém com mais de trinta anos" [há sessenta anos atrás] e que viveu às turras com a caretice da geração dos seus pais, ridiculamente conhecida como "greatest generation". Um certo conflito de gerações sempre vai existir, mas não dá para nem sequer começar a comparar isso com algo que começa com séculos de escravidão e se completa com segregação, linchamento e outras coisas do tipo.

Indignação não exprime o sentimento geral da rapaziada na universidade. Estamos exaustos. O que pode produzir um estado prolongado de indignação que não resulta em absolutamente nada? Todos os alunos [e professores] não-brancos [no sentido trúmpico da coisa, por cujos critérios nem 5% dos autodenominados brancos no Brasil passariam como brancos] estão simplesmente exaustos.

 

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