Descobri recentemente que, para as estatísticas da universidade onde trabalho, um professor, aluno ou funcionário africano, árabe ou chinês não conta nas estatísticas de diversidade racial. Só cidadãos americanos contam nos cálculos. Não basta ser africano, tem que ser African American. Pensei até em propor um abaixo-assinado com um aluno do Panamá e uma funcionária da Bósnia pedindo pela mudança nesses critérios. Mas a verdade é que com o veto a vistos para países como a Nigéria, o caminho aqui em Babylon já está sendo trilhado faz tempo - não me surpreenderia se fosse convidado a ir embora daqui há uns 15 anos. Reconsiderei meu ímpeto inicial porque fiquei com preguiça - se querem me invisibilizar, tudo bem. Aceito minha invisibilidade de bom grado.
Li ontem um texto curto de Audre Lorde recentemente traduzido para o português. Ela insiste num gesto: romper o silêncio e transformá-lo em linguagem e ação, recusando o medo de se expressar. Um texto forte e corajoso em 1984, ainda mais porque fala na disposição do status quo de destruir um indesejável, mesmo o mais silencioso deles. Mas quase quarenta anos depois, a cacofonia é insuportável e fiquei pensando na necessidade da preservação do silêncio. Fazer do silêncio uma missão. Combater o ruído barulhento da vida de hoje e fazer do silêncio uma ação. Depois desconfiei que eu andava só querendo arrumar um discurso para rejeitar a ansiedade e abraçar a depressão. Narciso escolhendo o espelho do lago, sempre.
E não é por coincidência que o recente caderno especial do NYT de Domingo com fotografias das nações africanas em processo de independência em 1960 tenha TODOS os textos assinados por africanos que moram na Europa ocidental ou nos Estados Unidos ou por filhos de imigrantes africanos. Do jogador Drogba a filhos de diplomatas e professores emigrados faz tempo. A invisibilidade da África que fala português não foi proposital - Portugal ainda se aferraria mais de uma década às suas colônias e por isso a ênfase foi em países onde se fala inglês ou francês como línguas francas. Mas a decisão de mascarar a preguiça primeiro-mundista com a desculpa de que se tratava de escolher "africanos cosmopolitas" me soou bem ridícula e preguiçosa. Como se não houvesse vida inteligente na África hoje em dia, nas pessoas trabalhando nas universidades e escrevendo da África. Elas são invisíveis para quem não quer ver. Mas as fotos são tão lindas e falam tanto por si, que compartilhei feliz o caderno nas redes sociais mesmo assim. Mas me ressinto um pouco dessa invisibilidade alheia que me priva de ler e conhecer o pensamento africano na África - para isso preciso fechar o jornal e procurar outros canais. Canais de contrabando cultural.
Li ontem um texto curto de Audre Lorde recentemente traduzido para o português. Ela insiste num gesto: romper o silêncio e transformá-lo em linguagem e ação, recusando o medo de se expressar. Um texto forte e corajoso em 1984, ainda mais porque fala na disposição do status quo de destruir um indesejável, mesmo o mais silencioso deles. Mas quase quarenta anos depois, a cacofonia é insuportável e fiquei pensando na necessidade da preservação do silêncio. Fazer do silêncio uma missão. Combater o ruído barulhento da vida de hoje e fazer do silêncio uma ação. Depois desconfiei que eu andava só querendo arrumar um discurso para rejeitar a ansiedade e abraçar a depressão. Narciso escolhendo o espelho do lago, sempre.
E não é por coincidência que o recente caderno especial do NYT de Domingo com fotografias das nações africanas em processo de independência em 1960 tenha TODOS os textos assinados por africanos que moram na Europa ocidental ou nos Estados Unidos ou por filhos de imigrantes africanos. Do jogador Drogba a filhos de diplomatas e professores emigrados faz tempo. A invisibilidade da África que fala português não foi proposital - Portugal ainda se aferraria mais de uma década às suas colônias e por isso a ênfase foi em países onde se fala inglês ou francês como línguas francas. Mas a decisão de mascarar a preguiça primeiro-mundista com a desculpa de que se tratava de escolher "africanos cosmopolitas" me soou bem ridícula e preguiçosa. Como se não houvesse vida inteligente na África hoje em dia, nas pessoas trabalhando nas universidades e escrevendo da África. Elas são invisíveis para quem não quer ver. Mas as fotos são tão lindas e falam tanto por si, que compartilhei feliz o caderno nas redes sociais mesmo assim. Mas me ressinto um pouco dessa invisibilidade alheia que me priva de ler e conhecer o pensamento africano na África - para isso preciso fechar o jornal e procurar outros canais. Canais de contrabando cultural.
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