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Showing posts from May, 2018

O tamanho do nosso buraco

1. Um Macri que pode mal disfarçar o seu desespero anuncia na televisão a volta da Argentina ao socorro urgente do FMI como um "ato preventivo". Sua fala é quase um pastiche do desespero também mal disfarçado de entusiasmo de um presidente De La Rúa falando em "blindagem internacional" às vésperas de uma hecatombe econômica que destruiu a Argentina. 2. Um Temer canastrão roda um tronco duro como a gomalina que segura seu penteado de vilão de chanchada e pontifica desde um pódio com microfone sobre as melhorias da economia e a recuperação do país enquanto o Brasil caminha a passos largos de volta para o inferno de fome, miséria e desemprego dos anos 90. 3. O discurso político é um gênero curioso. Mesmo no caso de exemplos menos crassos que os dos nossos dois tristes palhaços neo-liberais (um eleito e o outro nem tanto) o distanciamento no tempo e espaço funciona paradoxalmente como uma lupa que vai revelando o que há de grotesco na performance dos políticos. 4.

Z, ou a volta dos que [afinal] nunca se foram

Acabo de assistir com meu filho Samuel o filme  Z de Costa Gavras, tão bom quanto o Missing  com Jack Lemon, ou quem sabe um pouco melhor.  Z  é de 1969 e revê-lo em 2018 me deu uma medida bem vívida do retrocesso que os últimos anos representam em vários aspectos. Numa metade do mundo, tiveram pelo menos a decência que reeditar a Guerra Fria com um novo fantasma, o terrorismo patrocinado por um Islamismo Fascista. Na outra metade, voltamos a estupidez da Guerra Fria sem que exista sequer uma sombra da União Soviética e do "Comunismo Internacional". O anti-comunismo [de quem não importa] espalha seus espantalhos na rua e passa o rodo em todo o mundo em nome de Deus, da Civilização Ocidental, [pasmem!] da Democracia e dos bons costumes dos homens de bem. Apesar de vários prêmios, inclusive nos Estados Unidos,  Z foi proibido no Brasil de Médici. Precisamos esperar 10 anos para finalmente ver o filme. Foi assim que  Z  Tornou-se atualíssimo. Costa Gavras desloca a história

Música: Adivinhem quem veio nos visitar ontem à noite?

This Tornado Loves You Neko Case My love I am the speed of sound I left them motherless, fatherless Their souls dangling inside-out from thier mouths... But it's never enough I want you I carved your name across three counties And ground it in with bloody hides Broken necks will line the ditch Till you "stop it! stop it! stop this madness! " I want you I have waited with a glacier's patience Smashed every transformer with every trailer Till nothing was standing Sixty-five miles wide But still you are nowhere, still you are nowhere, nowhere in sight Come out to meet me, run out to meet me Come into the light Climb the boxcars to the engine Through the smoke and to the sky Your rails could always outrun mine so I I picked them up and crashed them down In a moment close to now Cause I miss, I miss, I miss, I miss How you'd sigh yourself to sleep When I'd rake the springtime across your sheets [Chorus] My love, I'm an o

5. O Brasil e o povo, incluem a sua pessoa?

--> No final dos anos 70 um livro com entrevistas com várias pessoas sobre a questão das patrulhas ideológicas no Brasil terminava com uma pergunta sobre as perspectivas para a implantação do socialismo no Brasil. Hélio Oiticica deu uma resposta curta que me volta à memória de tempos em tempos feito uma assombração:  “Socialismo no Brasil? Eu estou achando quase impossível, o Brasil é um país bem fascista…” Essa declaração destoava completamente do tom geral da época, quando uma entidade altamente idealizada chamada "povo" mobilizava as esperanças de muita gente de construir um Brasil novo logo que nos livrássemos da estupidez dos milicos. O problema é que os milicos eram só a ponta visível de um imenso iceberg de estupidez que mostraria suas garras na primeira eleição livre para presidente depois da ditadura, com a vitória de um tal de Fernando Collor.  Mas é preciso ter um pouco de cuidado com uma espécie de reverso da idealização do povo e do Brasil c

4. Vivendo entre búfalos e cisnes

Em “Academias de Sião”, Machado de Assis nos oferece uma pergunta como a serpente oferece o fruto a Adão e Eva no paraíso, com aquela ambivalência característica dos narradores de Machado, essas vozes irônicas não levam nem o gesto nem a pergunta completamente a sério, sem que isso signifique exatamente uma farsa. É a pergunta que ocupa as quatro academias de Sião (que o narrador admite logo na abertura do conto serem puramente imaginárias): “por que é que há homens femininos e mulheres masculinas?” No conto não se trata de uma pergunta puramente especulativa, feita no abstrato. A motivação por trás da pergunta é “a índole do jovem rei”: Kalafangko era virtualmente uma dama. Tudo nele respirava a mais esquisita feminilidade: tinha os olhos doces, a voz argentina, atitudes moles e obedientes e um cordial horror às armas. Os guerreiros siameses gemiam, mas a nação vivia alegre, tudo eram danças, comédias e cantigas, à maneira do rei que não cuidava de outra coisa.