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Showing posts from May, 2014

Traduzindo uma tradução: Daniel Sada "de volta" ao português

Arte minha: "O caco de lua que a janela emoldura" Eis a abertura do conto de  Daniel Sada chamado "El fenómeno ominoso" na minha tradução para o português, no original em espanhol e na tradução para o inglês de Katherine Silver: "Pode-se viver longe, muito longe, lá onde não chega estrada alguma nem há trilhos de trem por perto: num velho aposento perdido na chapada; lá onde não existem nem veredas fortuitas nem inimigo que salte, nesse duro espaço que amolda vontades e cede ao abandono deixando atrás de si os ares mundanos, a esfumaçante sociedade que nunca pára, as tentações imediatas. Em troca... optar e para sempre pelo retiro, pela experiência viva que afina os sentidos e alarga toda a forma. Acaso seria necessário? Não, mas uma vez, sim, - aproximadamente - se pode viver sozinho. Longe, onde o tempo não apressa as sábias lentidões." "Se puede vivir lejos, muy lejos, allá donde no llega ninguna carretera ni hay vías de tren cercanas:

Postal: 1492, 1905, 1961

Imagens:  1. "Primeros homenajes en el Nuevo Mundo a Colón"  José Garnelo Alda, 1892,  Museo Naval de Madrid 2. "Lord Curzon [Vice-rei da India]  e o Nizam de Hyderabad  ["admnistrador" dos territórios onde estão hoje os estados de Andra Pradesh, Karnataka e Maharashtra], Índia , 1905 3. John F. Kennedy  e o presidente da Venezuela Rómulo Betancourt  em palanque em La Morita, Venezuela, 1961. "O Progresso e a Modernidade substituíram a missão cristã de Espanha e Portugal e  a missão civilizatória de França e Inglaterra e tornaram-se o novo objetivo da versão imperial dos Estados Unidos para os colonialismos anteriores." Walter Mignolo, " Globalization, Civilization Processes,  and the  Relocation of Languages and Cultures"

Postal da Babilônia

Arte Minha: Glossário "It's possible to find something sinister  in the effort to hide half your emotional spectrum from your children."  Comentário sobre o hábito bizarro de certos pais aqui nos Estados Unidos de NUNCA dar o menor sinal de raiva ou frustração ou desespero com os filhos 

Decálogo para enfrentar ano de eleições na internet

Eu não me canso de ficar espantado com a infantilidade do bate-boca [a palavra debate não se aplica aqui] sobre política que se intensifica em ano de eleições. Nem quero discutir o dilúvio de fraudes [fotos montadas, fotos com legendas completamente falsas e associações alucinadas] que vem por aí. Independente dele, o conteúdo do tal bate-boca é digno de uma revista de fofoca e as estratégias retóricas são dignas daquelas intermináveis discussões entre torcedores de futebol de times rivais. Alguns exemplos: 1. O sujeito que fica indignado quando "acusam" seu candidato de beber demais, mas espalha alegremente que o outro candidato não passa de um "cheirador de cocaína". Pois eu preferiria um presidente pinguço e cheirador de cocaína com uma proposta de governo convincente a mais um abstêmio empunhando uma vassoura moralista [sejamos inventivos: que tal um rodo para "passar o rodo" nos marajás?]. Vem aí uma chuva de preconceitos para os inimigos e um venda

Postal: "politics is not spreading honey"

"... politics is not spreading honey around the main building at the Documenta art exhibition. It's putting electrodes on people's texticles, locking them up, putting them in fear of their lives.  There was some anger separating me from the naïveté of Jasper Johns, who could celebrate his national flag so un-ironically.  In South Africa you could not begin to paint the flag." William Kentridge

"A troca incessante de canais" como estética

Tá no Ar a TV na TV - Episodio 1 by AdneTRIP "Even when the museum uses video and television programming in supplementary and didactic ways, it offers an alternative to channel flicking that is grounded in the materiality of the exhibited objects and in their temporal aura." [33]  "... buried under the rubble of a discourse textuality that proceeds increasingly according to the laws of channel flicking" [64-65] "... fantasies of omnipotence: channel-flicking as the  contemporary strategy of narcissistic  derealization." Traduzido por Sérgio Alcides [que está passando um semestre aqui em Yale] como "troca incessante de canais", o termo aparece três vezes no livro Twilight Memories: Marking Time in a Culture of Amnesia  de Andreas Huyssen, que ganhei do meu irmão Pedro há um tempão mas que só terminei de ler hoje, me preparando para escrever um texto sobre a memória do período da ditadura e adaptações de livros escritos por ex-prisioneir

Frasista

"It is clearer than crystal to the capitalist lords of our planet and of everything in it that things in general are settled for ever: that we should cost as little as possible when at work and we should spend as much as possible when not; that the losses belong to all of us but the profits belong only to them; that we should choose judiciously between two versions of the same thing every four years; and that we should keep the wheels turning whether we die on the way or die when we finally reach the precipice." "Capitalism is a formidable machine that turns everything into a commodity, reduces everyone to human labor, and churns out a spectacular, sad army composed of the depressed, the anxious and the numb; the obese and the hungry; the heartless and the heartbroken; the cynic and the fundamentalist; the tycoon and the homeless." "Work to death to buy more of what you don't need and if it's not enough don't worry: cred

Recordar é viver: o grito de um heterodoxo sitiado entre ortodoxias

Andrzej Pagowski, "Uriel Acosta" Cartaz para o National Jewish Theater (E. R. Kaminski) c.1980s Uriel/Gabriel da Costa nasceu em O Porto em 1585 teria recebeu educação católica [pelo menos da porta de casa para fora] da sua família de judeus convertidos, muitos deles vítimas da inquisição Portuguesa. Aos 22 anos Uriel se enche de dúvidas sobre a fé que ele estudara com afinco e devoção até então, uma vez que "a razão me ditava muitas coisas e continuamente sussurrava ao meu ouvido algumas que eram manifestamente contrárias" à sua fé. Em completo segredo ele começa a estudar o Pentateuco e acaba resolvendo abandonar seu cargo eclesiástico e cair fora, levando mãe e irmãos para Hamburgo, onde passa a praticar abertamente o judaísmo. Mas há um imenso contraste entre o judaísmo que ele aprende e ensina escondido em sua casa em Portugal e o que é praticado abertamente em Hamburgo: "Ao cabo de uns di as, me dei conta de que os costumes e regulamentos

Música: Step Right Up de Tom Waits em três versões

Tom Waits, fazendo poesia da mais alta qualidade com a matéria mais besta do dia-a-dia, rindo do nosso achaque comercial de todos os dias nos contratos de prestações de serviços e atendimentos feitos por telefone [" large print giveth,  and the small print taketh away"]  e adicionando aquele tempero manqué daqueles sensacionais vendedores de rua de qualquer esquina de qualquer cidade onde ainda há esquinas não-privatizadas e não-higienizadas.  Step Right Up Tom Waits Step right up, step right up, step right up, Everyone's a winner, bargains galore That's right, you too can be the proud owner Of the quality goes in before the name goes on One-tenth of a dollar, one-tenth of a dollar, we got service after sales How about perfume? we got perfume, how 'bout an engagement ring? Something for the little lady, something for the little lady, Something for the little lady, hmm Three for a dollar We got a year-end clearance,  we got a white sale And a smoke

Machado de Assis, precursor de Rousseau

Jean-Jacques Rousseau Joaquim Maria Machado de Assis O original em francês não tem nada demais:            "Le remords s'endort devant un destin prospère, et s'aigrit dans l'adversité." Em português seria mais ou menos algo assim:           "O remorso adormece ante um destino próspero, e se amargura na adversidade"   Mas a tradução para o inglês "corrige" o original, estabelecendo na frase um sentido de simetria ausente do original que eu acho uma beleza:           "remorse sleeps in the calm sunshine of prosperity, but wakes amid the storms of adversity" E em português a tradução da tradução para o inglês seria algo assim:            "O remorso dorme sob a serena luz solar da prosperidade, mas acorda em meio às tempestades da adversidade." A tradução inglesa é um pouco "over-the-top" e poderia ser um pouquinho menos floreada para ficar assim [e de pa

Malavita!

Mariano Rajoy Jacques Chirac Helmut Kohln Carlos Salinas de Gortari Maluf Berlusconi Perry Anderson escreveu no London Review of Books um artigo que deveria ser amplamente lido e discutido no Brasil. O artigo trata de problemas supostamente europeus, mas na verdade descreve com clareza uma crise no sistema político-representativo que é, em realidade, mundial. Deixo aqui apenas um trecho: "[...] the [European] Union is not an excrescence on member states that might otherwise be healthy enough. It reflects, as much as it deepens, long-term trends within them. At national level, virtually everywhere, executives domesticate or manipulate legislatures with greater ease; parties lose members; voters lose belief that they count, as political choices narrow and promises of difference on the hustings dwindle or vanish in office. With this generalised involution has come a pervasive corruption of the political class, a topic on which political sc