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Coronga blues no mês do desgosto

 Depois de um mês de trabalho árduo, estou na página 94 da seção principal do meu novo livro, que já conta com bem mais de 300 páginas no seu projeto original. A que custo! Acabei me enterrando numa terrível depressão da qual estou tentando sair desesperadamente antes que o semestre comece. Porque depressão para mim significa ter dificuldade de ir numa loja e falar com um vendedor antes de comprar alguma coisa ou de responder a uma mensagem rotineira qualquer. Então imaginem só eu entrando na marra numa sala de aula nesse estado. Tenho uma vontade tremenda de chutar tudo e me enterrar na cama que não pode acontecer. E assim vivo alternando noites de insônia que acabam às 6:30 da manhã com longos sonos de 16 horas cheios de pesadelos aborrecidos. 

Mas terá mesmo sido o maldito livro que não acaba o culpado? Ou terá sido não ter ido [de novo] ao Brasil e assim conviver com a ideia da morte da minha mãe e dos meus laços com o lugar onde eu nasci e cresci. Terá sido a insuportável burocracia acadêmica tão burra e o desinteresse generalizado por literatura e artes, quando não o desprezo por tudo o que eu mais prezo? Terá sido a maldita poison ivy e os mosquitos sanguinários do verão dos Estados Unidos que me confinaram duas semanas dentro de casa com os braços sangrando e ainda coçando e fazendo e desfazendo bolhas em carne viva? Terá sido o insuportável Brasil de Bolsonaro, essa enorme cloaca imbecil de onde só sai o pior do pior? Terá sido a insanidade de viver, enquanto isso, num país em que as vacinas abundam mas quase 40% da população diz "não, obrigado; não vou me vacinar e nem vou usar máscaras" e vamos aqui e lá morrendo e morrendo e sofrendo endividados com gastos médicos loucos? Terá sido o medo de estar com câncer? Terá sido o serviço médico que é um lixo em todos os sentidos e me faz esperar quase um ano por resultados? Terá sido simplesmente o nível da substância X ou Y que insiste em ficar baixo mesmo com um consumo diário de remédios que os outros me dizem que eu vou ter que tomar o resto da vida para continuar sendo "produtivo"?

Eu não sei o que é que me trouxe até aqui. Não consigo responder satisfatoriamente a essa pergunta. Não consigo resolver nem se um fator é mais importante que o outro. Sei que qualquer psicólogo mequetrefe diria que esse meu não saber é também apenas sintoma da doença que habita dentro de mim feito um hóspede indesejado que não vai embora. 

Bom, fé no citalopran [que eu não tomei hoje] e vamos seguir em frente. Escrevendo, estudando, trabalhando, cozinhando e lavando roupa.


Comments

Eu te entendo.
Meu caro, espero que a gente ainda possa tomar uma cerveja em BH-Brasil e que esse bando de loucos volte para o buraco de onde saíram. Abraço!
Paulo said…
Eu estou precisando me aposentar e ir criar galinhas no meio do mato.
Diego said…
Oi Paulo, vejo que muitos estamos em situação parecida com a que você descreveu – sofrer pra falar com vendedores é algo que conheço bem; e também com dificuldade em saber as causas, embora desconfiando de muitas. Resta enviar mutuamente os melhores desejos buscar espaços onde ainda se possa florecer. Curioso pelo novo livro! Abraços
Paulo said…
Obrigado, Diego. Está ficando bem interessante. Espero que tenha editora e depois leitores!

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