Decasia*
a orquestra de cinquenta e cinco fúrias
pulsavançatravancapita
pontuando
festivosinistra a película
que engole e regurgita as imagens do filme
em sequência de sonho mecânico:
o tear nervolento que roda na mão
a manivela que roda na mão do moço
o carrossel que roda a cada dez centavos,
a roda gigante de madeira que roda,
até que chega o dançarino asceta, rodando –
suspende a orquestra em massa em suspenso o mundo
e sobra o
apito sibilante.
O dançarino sufi roda
com os braços abertos em êxtase em câmara lenta
roda a saia roda o braço do outro roda a roda
roda roda roda roda a dor a dor me adora
é consolo de muitos crer
que sofrer nos melhora mas
o sofrimento não nos melhora em nada
e é consolo de muitos crer
que a dor quanto mais forte
por isso mesmo melhor e mais nobre
e é consolo de muitos crer
que termina mais resistente aquele
que sobrevive ao pesadelo
do sofrimento agudo intenso e duro
mas o sofrimento não melhora nem enobrece nada
e do meu lote todo até agora
só tirei esse poderzinho pífio
de reconhecer nos olhos dos outros –
no caixa do banco, no padeiro,
na professora do meu filho,
no meu irmão, num mendigo –
a mesma marca líquida que eu tenho
no canto dos olhos,
a marca líquida da corda que esticou
até arrebentar
com os braços abertos em êxtase negativo em câmara
lenta
e esse mesmo corpo frouxo,
esses mesmos olhos moles,
e essa mesma corda elétrica solta no ar,
balançando e chiando a mesma nota surda
roda a saia roda o braço do outro roda a roda
roda roda roda roda a dor a dor me adora
Comments