Coloco em versos, esta longa frase de Bolívar, que é não apenas bolivariana
mas também faulkneriana em versos porque acho que assim ela fica ainda mais
bonita:
Yo considero
el estado actual de América,
como cuando desplomado el imperio romano
cada desmembración
formó un sistema político,
conforme a sus intereses y situación,
o siguiendo la ambición particular
de algunos jefes, familias o corporaciones,
con esta notable diferencia,
que aquellos miembros dispersos
volvían a restablecer sus antiguas naciones
con las alteraciones que exigían las cosas o los sucesos;
mas nosotros,
que apenas conservamos
vestigios de lo que en otro tiempo fue,
y que por otra parte
no somos indios, ni europeos,
sino una especie mezcla
entre los legítimos propietarios del país
y los usurpadores españoles;
en suma,
siendo nosotros americanos por nacimiento,
y nuestros derechos los de Europa,
tenemos que disputar a éstos a los del país,
y que mantenernos en él contra la invasión de los invasores;
así nos hallemos en el caso
más extraordinario y complicado.
Nesse trecho da famosa “Carta de Jamaica” está o germe da idéia da
miscigenação como legitimação da dominação. O “nós” de Bolívar se constitui
como fruto de uma marota dupla miscigenação: por um lado, esse “nós” é mescla
dos legítimos proprietários [índios] e dos usurpadores [españoles], por outro é
composta de americanos por nascimento e europeus por direito. Este “nós”, concebido
e constituído pelo texto de Bolívar, precisa por isso lutar em duas frentes
simultâneas: internamente eles lutam por seus direitos [los de Europa] contra
os nativos [los del país] tanto quanto
lutam desesperadamente contra invasores externos, a trinca Inglaterra, França e
Estados Unidos. Oprimidas no âmbito internacional e opressoras no âmbito
interno, essas elites latino americanas estão constituídas por essa ambigüidade
formadora. São um patético (ou esperto) ornitorrinco, lutando contra um pai
opressor em cuja superioridade eles acreditam com todas as forças, porque só
assim estão prontas para também legitimar a sua exploração secular alegando ao
mesmo tempo, marotamente, “ter um pé na cozinha”.
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