Skip to main content

Diário da Babilônia: Flórida e Pindorama

O mercado imobiliário na Flórida tem reputação de grande instabilidade, com períodos de crescimento vertiginoso seguidos por uma quebradeira generalizada, que inclui cidades inteiras que buscam atrair novos moradores com um IPTU excepcionalmente baixo e começam a pedir dinheiro emprestado para construir e manter escolas e o resto da infraestrutura. Há quem diga que o mercado imobiliário que sustenta o estado não passa de uma pirâmide que depende da chegada de pelo menos 1000 novos participantes ao ano para continuar funcionando. Sugiro ao leitor que passe um inverno no nordeste dos EUA [para não falar do meio-oeste] e o invernozinho ameno da Flórida explica parte dessa atração. Mas apenas parte e a Flórida foi muito afetada pela crise financeira de 2008 [lá a casa começou a cair já em meados de 2005], mais que a média nos EUA.

Um exemplo da bandalheira: um dono de salão de tatuagens em St. Peteresburg chamado Sang-Min Kim vendeu, entre 2004 e 2009, noventa imóveis na região de Tampa, ganhando 4 milhões de dólares. Os compradores, que tinham dado pouco ou nada de entrada e financiado o resto, eram impossíveis de se encontrar, alguns deles criminosos julgados por tráfico de drogas ou outros delitos. Um terço dos negócios de Kim foram financiados por um tal de Howard Gaines, sentenciado a 45 anos de prisão por fraude na Flórida. O pessoal do presídio não pode votar mas pode participar da festa do mercado imobiliário no estado. O tal Kim ganhava dinheiro vendendo e re-vendendo imóveis que em geral sequer eram ocupados. Aqui está uma reportagem da New Yorker sobre o assunto.

17 das 25 cidades com maior número de perda de imóveis por indimplência são da Flórida. Miami é a campeã com mais de 18% das hipotecas não pagas - quando se trata dos empréstimos com juros flutuantes para pessoas sem boas condições de crédito [as famigeradas "sub-prime mortgages"] a porcentagem de perdas de casas chega a 39.1%. Anos de pagamentos perdidos, casas tomadas pelos bancos abandonadas, gente no olho da rua. Por vezes, bairros inteiros praticamente vazios, sendo tomados pelo mato.

  



Em 2014 10% desse mercado consiste de compras feitas por estrangeiros não-residentes no estado, com 26.500 unidades vendidas em transações envolvendo 7.97 bilhões de dólares. 23% desses compradores são da América Latina, principalmente de Venezuela, Brasil, Argentina, Colombia e Peru. 82% dessas vendas de imóveis para estrangeiros são pagas em dinheiro, à vista, o que contrasta fortemente com o mercado doméstico típico que usa empréstimos bancários de longo prazo com o próprio imóvel comprado como garantia 88% dos casos. 

O país campeão é o Canadá, com 31.6% das vendas mas com uma média de preço [$200.000) bem abaixo dos outros estrangeiros. O auge dos compradores brasileiros aconteceu em 2012, com 9.3% e eles compram imóveis mais caros que a média [$409.600] e 69% deles pagaram em dinheiro. 31% dos brasileiros pretendiam viver nos seus imóveis um ou dois meses por ano e 31% pretendiam viver por pelo menos 6 meses. Os dados foram tirados de um relatório preparado por associação de corretores de imóveis da Flórida. 

 O câmbio e a crise global já afetaram muito as vendas à vista para latino-americanos e russos e, apesar do visível pânico de não provocar pânico, o mercado de imóveis da Flórida pode estar começando a enfrentar mais um capítulo da crise.

 

Comments

Popular posts from this blog

Diário do Império - Antenado com a minha casa [BH]

Acompanho a vida no Brasil antes de tudo pela internet, um "lugar" estranho em que a [para mim tenebrosa] classe m é dia brasileira reina soberana, quase absoluta, com seus complexos, suas mediocridades e sua agressividade... Um conhecido, daqueles que ao inv és de ter um blogue que a gente visita quando quer, prefere um papel mais ativo, mandando suas "id éias" para os outros por e-mail, me enviou o texto abaixo, que eu vou comentar o mais sucintamente possível: resolvi a partir de amanh ã fazer um esforço e tentar, al ém do blogue, onde expresso minhas "id éias" passivamente, tentar me comunicar diretamente com as pessoas por carta... OS ALUNOS DE UNIVERSIDADES PARTICULARES DERAM UMA RESPOSTA; E A BRIGA CONTINUOU ... 1 - PROVOCAÇÃO INICIAL Estudar na PUC:............... R$ 1.200,00 Estudar no PITÁGORAS:..........R$ 1.000,00 Estudar na NEWTON:.....R$ 900,00 Estudar na FUMEC:............ R$600,00 Estudar na UNI-BH:........... R$ 550,00 Estudar na

Uma gota de fenomenologia

Esse texto é uma homenagem aos milhares de livrinhos fininhos que se propõem a explicar em 50 páginas qualquer coisa, do Marxismo ao machismo e de Bakhtin a Bakunin: Uma gota de fenomenologia Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele p

Protestantes e evangélicos no Brasil

1.      O crescimento dos protestantes no Brasil é realmente impressionante, saindo de uma pequena minoria para quase um quarto da população em 30 anos: 1980: 6,6% 1991: 9% 2000: 15,4%, 26,2 milhões 2010: 22,2%, 42,3 milhões   Há mais evangélicos no Brasil do que nos Estados Unidos: são 22,37 milhões da população e mais ou menos a metade desses pertencem à mesma igreja.  Você sabe qual é? 2.      Costuma-se, por ignorância ou má vontade, a dar um destaque exagerado a Igreja Universal do Reino de Deus e ao seu líder, Edir Macedo. A IURD nunca representou mais que 15% dos evangélicos e menos de 10% dos protestantes como um todo. Além disso, a IURD diminuiu seu número de fiéis   nos últimos 10 anos de acordo com o censo do IBGE, ao contrário de outras denominações, que já eram bem maiores. 3.      Os jornalistas dos jornalões, acostumados com a rígida hierarquia institucional católica não conseguem [ou não tentam] entender muito o sistema