Skip to main content

Notícias do jardim aqui de casa


1. Criar plantas a partir da semente é um processo bem complicado. Até agora tive mais fracassos que sucessos. Tenho dificuldade para arrancar um de dois brotos que disputam o mesmo espaço. Fico tentando cuidadosamente arrancar um deles para transplantar e acabo matando os dois. 

2. Aliás tenho dificuldades em retirar certos tipos de "mato" - se ele é bonitinho logo me enterneço. Fiz um carramanchãozinho com bambu e arames para um bando de trepadeiras matozas e foi meu único caso realmente feliz de "jardinização" de plantas vagabas. Dentes de Leão eu amo e me recuso a tirar, definitivamente. Abomino usar veneno para matar pragas ou ervas daninhas. Fico me convencendo que sou frouxo assim porque o jardim ainda tem muito o que crescer. O imenso bambuzal no fundo do terreno parece que morreu com uma semana de frio glacial que tivemos esse ano - o bambu é uma praga assustadora que vai se espalhando e crescendo com uma velocidade impressionante - e fico olhando para a cortina de folhas secas meio em luto. 


3. O resultado é que os jardins aqui de casa estão longe de impressionar. As melhores partes dele são os projetos como o jardim da frente da casa, que fiz com Letícia, que não tem essas bobagens. Nossa querida Pibi posa para mim ao lado da minha horta. 

4. Tenho orgulho de um semi-círculo que fiz com ervas e plantas aromáticas. Me inspirei num programa de jardinagem inglês que Letícia descobriu. Num episódio desse programa eles mostravam a construção de um jardim feito pelos pais de uma criança autista que queriam que a criança pudesse aproveitar ao máximo os estímulos olfativos e tácteis. Plantei num semi-círculo orégano, manjericão, tomilho, alfazema, citronela, alecrim, hortelã, menta e sálvia. Não sobreviveram ao inverno a alfazema, a citronela e o manjericão. Esse ano vou plantar essas em vasos para poder recolher quando esfriar.  





5. Tenho antipatia pela grama. Aqui não chove o suficiente e a grama só fica verdinha e feliz às custas de uma tonelada de químicos e galões e mais galões de água. Temos plantado tufos de gramas daqui de Oklahoma, que sabem viver em solo arenoso e sem tanta água. O irônico é que elas são caras de comprar em lojas. Já saímos de pá e sacos no porta-mala do carro procurando cantos de estrada para pegar esses tipos de gramas de graça.  

6. As plantas não morrem como a gente. Para quem vive em climas não-tropicais, esse negócio de ressuscitar é uma coisa bem banal com as plantas. Muitas plantas "morrem" no fim do outono e "renascem" na primavera - ficam na verdade hibernando debaixo da terra e até crescem assim. 

7. Muitas plantas não existem muito como unidades independentes, mas sim como bandos interdependentes. Você arranca um galho e planta e nasce outro pé - os alecrins são assim. Você corta um pedaço e elas crescem até mais. Plantamos uma mudinha dessa florzinha, ela "morreu" no inverno e nasceu assim:


8. Tanta gente estudando rizomas, religiões afro-brasileiras e não-sei-mais-o-quê não tem a menor ideia do que vivem as plantas de fato - urbanóides convictos que acham que contato com a natureza é fazer churrasco e tomar cerveja na piscina de um sítio. Conhecimento em estado puramente abstrato, de gabinete. 

9. Conviver com as plantas, conviver com o silêncio das plantas, é uma das coisas que me manteve vivo em momentos difíceis da vida. Enfarado de escrever sobre coisas ruins, resolvi escrever esse diário sobre esse nadinha que não interessa a ninguém. Mas que me mantém vivo.

Comments

Popular posts from this blog

Contos: "O engraçado arrependido" de Monteiro Lobato

Monteiro Lobato conta em "O engraçado arrependido" a história trágica de um homem que não consegue se livrar do papel de palhaço da cidade, papel que interpretou com maestria durante 32 anos na sua cidade interiorana. Pontes é um artista, um gênio da comédia e por motives de espaço coloco aqui só o miolo da introdução em que o narrador descreve o ser humano como “o animal que ri” e descreve a arte do protagonista: "Em todos os gestos e modos, como no andar, no ler, no comer, nas ações mais triviais da vida, o raio do homem diferençava-se dos demais no sentido de amolecá-los prodigiosamente. E chegou a ponto de que escusava abrir a boca ou esboçar um gesto para que se torcesse em risos a humanidade. Bastava sua presença. Mal o avistavam, já as caras refloriam; se fazia um gesto, espirravam risos; se abria a boca, espigaitavam-se uns, outros afrouxavam os coses, terceiros desabotoavam os coletes. E se entreabria o bico, Nossa Senhora! eram cascalhadas, eram rinchavelhos, e...

Poema meu: Saudades da Aldeia desde New Haven

Todas as cartas de amor são Ridículas. Álvaro Campos O Tietê é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia, mas o Tietê não é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia porque não corre minha aldeia. Poucos sabem para onde vai e donde vem o ribeirão da minha aldeia, 
 que pertence a menos gente 
 mas nem por isso é mais livre ou menos sujo. O ribeirão da minha aldeia 
 foi sepultado num túmulo de pedra para não ferir os olhos nem molhar os inventários da implacável boa gente da minha aldeia, mas, para aqueles que vêem em tudo o que lá não está, 
 a memória é o que há para além do riberão da minha aldeia e é a fortuna daqueles que a sabem encontrar. Não penso em mais nada na miséria desse inverno gelado estou agora de novo em pé sobre o ribeirão da minha aldeia.

Uma gota de fenomenologia

Esse texto é uma homenagem aos milhares de livrinhos fininhos que se propõem a explicar em 50 páginas qualquer coisa, do Marxismo ao machismo e de Bakhtin a Bakunin: Uma gota de fenomenologia Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele p...