Continuamos aquela conversa por duas semanas, sentados frente a frente na mesa de jantar da minha casa, discutindo todo o tipo de assunto e ele, sem nunca se alterar, com profundidade e bom senso sobre-humanos, me explicou os mistérios do céu e da terra. Saí dali convicto que o pastor era quem dizia e não mais um subversivo estrangeiro qualquer e passei a anotar minuciosamente em um caderno de capa de couro tudo que ele me contou sobre nosso mundo e também sobre o mundo dele e o espaço sideral em geral. Transcrevo um pequeno exemplo da sua sabedoria: “De forma alguma fábricas são sempre construídas para resolver problemas fundamentais. A grande maioria delas estão ocupadas com a produção de cosméticos, jóias, badulaques femininos, incontáveis bolsas, chapéus ridículos, novidades banais, esmalte de unha, sapatos que machucam os pés e estragam a cavalgadura, meias que não oferecem proteção alguma, charutos que envenenam o corpo, goma de mascar, bolas de futebol, pistolas e armas de caça, munição, bebidas alcoólicas e outros estimulantes; todavia existe uma infinidade de outras coisas úteis e necessárias que poderiam ser produzidas em massa, tais como: material de construção, medicamentos, hormônios vegetais sintéticos, máquinas para produzir energia, fogões eletrônicos, alimentos concentrados para populações em desalinho, livros científicos e filosóficos, sapatos de plástico, instrumentos cirúrgicos e ortopédicos, fertilizantes, colhedeiras e sementeiras mecânicas, inseticidas, casas pré-fabricadas, móveis indestrutíveis, instrumentos de mineração, etc.”
Todas as cartas de amor são Ridículas. Álvaro Campos O Tietê é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia, mas o Tietê não é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia porque não corre minha aldeia. Poucos sabem para onde vai e donde vem o ribeirão da minha aldeia,
que pertence a menos gente
mas nem por isso é mais livre ou menos sujo. O ribeirão da minha aldeia
foi sepultado num túmulo de pedra para não ferir os olhos nem molhar os inventários da implacável boa gente da minha aldeia, mas, para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
a memória é o que há para além do riberão da minha aldeia e é a fortuna daqueles que a sabem encontrar. Não penso em mais nada na miséria desse inverno gelado estou agora de novo em pé sobre o ribeirão da minha aldeia.
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