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Benito Juárez no privado e na vida pública




Em 1819 Benito Juárez, índio zapoteca, orfão ainda na infância, chega com 12 anos à casa dos Maza Parada, onde sua irmã Josefa trabalha como empregada doméstica. Sete anos depois, em 1826 nasce Margarita Eustaquia, adotada pelos donos da casa. Em 1843, Juárez tornou-se um advogado prominente e militante do Partido liberal quando se casa com Margarita, que tinha então 17. Juárez tinha de 37 anos e já tinha vivido com Juana Rosa Chagoya, com quem teve dois filhos. Com Margarita Benito teve 12 filhos, 5 deles falecidos ainda antes dos 7 anos de idade. 9 anos depois do casamento ele defende publicamente a necessidade de oferecer educação às mulheres em nome do bem comum:

“Formar a la mujer con todas las recomendaciones que exige su necesaria y elevada mission, es formar el germen fecundo de regeneración, mejora social. Por esto es que su educación jamás debe descuidarse.”
Congreso de Oaxaca, 1852

Uma carreira meteórica levaria Juárez à presidência do México. Mas as muitas turbulâncias daqueles tempos também o forçariam a passar temporadas longe de sua família. Numa de suas cartas privadas ao seu genro ele se expressa assim a respeito da educação dos filhos:

“suplico a usted que no los ponga en bajo la dirección de ningun jesuita ni de ningun sectario de alguna religion; que aprendan a filosofar, esto es, que aprendan a investigar el por qué o la razón de las cosas, para que en su tránsito en este mundo tengan por guía la verdad y no los errores y preocupaciones que hacen infelices y degradados a los hombres y a los pueblos.”

A principal das turbulências que Juárez enfrentou foi a invasão do México por Inglaterra, França e Espanha para punir os mexicanos por uma moratória da dívida. O ditador feito imperador dos franceses, Napoleão III, resolve manter suas tropas no México e submeter o país a um príncipe austríaco, Maximiliano (primo de D. Pedro, que conheceu quando viajou ao Brasil numa expedição científica). Contam eles com o apoio pusilânime dos setores mais reacionários da sociedade mexicana no clero e no patido conservador, inconformados com o fim de privilégios que herdaram do tempo colonial. Em 1864 Juárez é convidado por Maximiliano para vir à capital e fazer um concerto conciliador em troca da aceitação da monarquia. Juárez responde o convite feito em privado com uma carta pública que termina assim:

Es dado al hombre, señor, atacar los derechos ajenos, apoderarse de sus bienes, atentar contra la vida de los que defienden su nacionalidad, hacer de sus virtudes un crimen y de los vicios propios la virtud; pero hay una cosa que está fuera del alcance de la perversidad y es el fallo tremendo de la historia. Ella nos juzgará.

Três anos depois Juárez estava na Cidade do México como presidente da república e vencedor triunfal da guerra de resistência à ocupação francesa. Juárez e os mexicanos salvaram a América Latina de ter o mesmo fim que a África ou o Oriente Médio, divididos entre europeus em protetorados e novos territórios coloniais. Chovem pedidos de personalidades como Victor Hugo para que Juárez perdoe Maximiliano, mas o príncipe e sua esposa são fuzilados – Manet tem a cara de pau de citar o quadro em que Goya denunciava as atrocidades napoleônicas na Espanha para pintar o fuzilamento do príncipe.

Depois de 5 anos de luta encarniçada, Juárez volta a capital e em seu manifesto triunfante escreve a sua frase mais famosa:

Que el pueblo y el Gobierno respeten los derechos de todos. Entre los individuos, como entre las naciones, el respeto al derecho ajeno es la paz.

Cinco dias depois de ler o manifesto Maximiliano era fuzilado. O primeiro nome e o sobrenome desse gigante mexicano chegam ao século XX nos nomes comuns de crianças como o futuro tenente brasileiro Juárez Távora e o future palhaço fascista Benito Mussolini.  

Comments

Pedro da Luz said…
Salve Benito Juárez e Viva México!!!!

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