Primeira Parte: Fanáticos ou Cínicos?
Jorge Julio López, pedreiro de profissão, nascido em Buenos Aires em 1929, era militante peronista e ficou preso de 1976 a 1979 em um dos 600 Centros Clandestinos de Detenção criados e mantidos pelo regime militar argentino em sua guerra de extermínio contra a subversão. Foi assim que Julio López teve a infelicidade de conhecer Miguel Etchecolatz, Diretor de Investigações da Provincia de Buenos Aires, cujo governador, o general Ibérico Saint Jean, declarou em 1977: "Primero mataremos a todos los subversivos, luego mataremos a todos sus colaboradores, después... a sus simpatizantes, enseguida... a aquellos que permanecen indiferentes y, finalmente, mataremos a los tímidos" [International Herald Tribune, París, 26 de mayo de 1977].
Julio López não morreu e em 1986, depois da ditadura, Miguel Etchecolatz foi julgado e condenado a 23 anos de prisão por crimes contra os direitos humanos. Seu julgamento foi anulado graças a lei “Obediência Devida”, baixada durante o governo Alfonsín em 1987 sob a pressão dos “carapintadas” de Aldo Rico, militares de baixa patente que se amotinaram em protesto contra a “perseguição” injusta dos civis, dizendo: "si quienes dieron las órdenes van a la justicia no tenemos ningún problema en ir todos a la justicia, pero ningún hombre de bien que vista uniforme militar puede ampararse escudándose en el sacrificio de sus subalternos".
Em 1998, com a chegada ao poder de Menen (que concedeu indultos aos militares ainda presos, inclusive a Aldo Rico), Etchecolatz estava tão seguro de sua impunidade que publicou um livro, La otra campana del Nunca Más (referência explícita ao livro que catalogava os ccrimes da ditadura argentina, cuja versão brasileira ficou conhecida como Brasil – Nunca Mais), defendendo seus atos como a ação de um cristão responsável que tinha que combater a subversão do ateísmo comunista que ameaçava a Argentina livre.
Aqui podemos ver Etchecolatz em programa de televisão argentino Hora Clave:
O que me chama a atenção é a dureza do entrevistador, Mariano Grondona. Uma dureza surpreendente para um direitista católico que apoiou o golpe militar e, antes mesmo do golpe, apoiou entusiasmado a José López Rega, o criador dos esquadrões da morte anti-subversão (os infames AAA) no governo de Isabelita Perón. Em 1977, em pleno genocídio que terminaria com 30.000 desaparecidos, Grondona dizia “Nadie diría que el presidente Videla, por ejemplo, sea un ‘duro’; todos lo pensamos, por el contrario, como un hombre naturalmente abierto para el diálogo y el entendimiento”.
Seria Grondona um dos “cínicos” ou dos “fanáticos” de que ele fala no começo da sua pergunta a Etchecolatz?
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