Skip to main content

Posts

Showing posts from October, 2010

Conto que traduzi há um tempão

Era uma vez Margaret Atwood - Era uma vez uma garota pobre, linda e muito boazinha, que vivia com sua madrasta malvada em uma casa na floresta. - Floresta? Floresta é um negócio passé , entende? Eu já estou cheia desse negócio de vida selvagem. Não é uma imagem adequada para a nossa sociedade, hoje em dia. Vamos de urbanidade, para variar. - Era uma vez uma garota pobre, linda e muito boazinha, que vivia com sua madrasta malvada em uma casa na cidade. - Agora melhorou. Mas eu tenho que questionar seriamente essa termo, pobre . - Mas ela era pobre! - Pobreza é uma coisa relativa. Ela vivia numa casa, não é? - É. - Então, em termos socioeconômicos, ela não era pobre. - Mas o dinheiro não era dela! Justamente a questão da história é que a madrasta malvada a obrigava a vestir roupas velhas e a dormir ao pé da lareira – - Ahá! Eles tinham uma lareira ! Com a pobreza , deixa eu te dizer, não tem lareira. Vamos ali na periferia, vamos subir a favela, vamos desce

Gregory Isaacs

Vejam como eu sou um homem otimista. Enquanto tanta gente nunca foi lá e quando pensa no Maranhão e se lembra da família Sarney, aliada de todos e antes de tudo de si mesma, eu não: quando eu penso no Maranhão, além de morrer de vontade de ir passar pelo menos uma semana por lá, me lembro que lá no Maranhão eles curtem há muito tempo o sensacional [infelizmente recém-falecido] Gregory Isaacs: Every time I hear the music and I make a dip, a dip Slave master comes around and spank I with his whip, the whip But if I don’t get my desire Then I'll set the plantations on fire My temperature is getting much higher Got to get what I require ‘Cause every time we do the work sometimes we are hurt, oh yeah Boss never do a thing but hold on to his girth But if I don’t get my desire Then I'll set the plantations on fire My temperature is getting much higher Got to get what I require Every time I hear the music and I move my hip, my hip Slave master comes around and spank I with his whip, a

estou achando quase impossível...

Flávia Cera tem um blogue muito interessante. Concordo com algumas coisas e discordo de outras, mas o que me atrai no blogue dela é o tom, um tom que eu agora percebo presente em muitos, mas não todos os meus blogues favoritos. Digo isso inspirado também por uma conversa que tive com a minha cara-metade sobre essas eleições e sobre um certo alívio de não ter que encontrar certas pessoas e ouvir certas barbaridades. Eu não acho que a barbaridade seja só uma questão de conteúdo, mas também de tom. Esse tom dos blogues de que eu estava falando é o tom das conversas que eu gostaria de ter nesses tempos difíceis. Porque uma opinião pode ser contundente e um discurso crítico pode estar engajado mas essa opinião contundente não precisa ser bélica e esse discurso crítico não pode ser panfletário. Acho que essa campanha eleitoral está sendo marcada pelos limites da nossa cultura autoritária, intolerante, violenta. A declaração de voto agora quase vira declaração de guerra, porq

Recordar é viver: os 2 desaparecimentos de Jorge Julio López [27-10-76 > 18-09-06]

Parte 2. “Una noticia, por mala que sea” Em 2003 as lei “Ponto Final” e “Obediência Devida” e os indultos de Menem foram anulados na justiça e no congresso com o apoio do novo presidente Kirchner. Em 2004 Etchecolatz pegou 7 anos pelo crime de roubo de bebês de prisioneros politicos, mas Etchecolatz foi mandado a cárcere privado, sob protestos veementes dos organismos defensores dos direitos humanos na Argentina. Em 2006 as leis de proteção aos criminosos da ditadura argentina tinham sido definitivamente derrubadas e Etchecolatz estava sendo novamente julgado pelo crime de genocídio, no dia 28 de junho de 2006 Julio López era uma das testemunhas de acusação. Aqui podemos ver algumas partes do testemunho de Julio López no julgamento de Etchecolatz: Acho o testemunho em si fortíssimo, talvez dispensando comentários, mais forte quando se pensa no seu desaparecimento pouco depois, ao fim do julgamento, Etchecolatz foi condenado a prisão perpétua. Mas Julio López não assistiu a

Recordar é viver: os 2 desaparecimentos de Jorge Julio López [27-10-76 > 18-09-06]

Primeira Parte: Fanáticos ou Cínicos? Jorge Julio López, pedreiro de profissão, nascido em Buenos Aires em 1929, era militante peronista e ficou preso de 1976 a 1979 em um dos 600 Centros Clandestinos de Detenção criados e mantidos pelo regime militar argentino em sua guerra de extermínio contra a subversão. Foi assim que Julio López teve a infelicidade de conhecer Miguel Etchecolatz, Diretor de Investigações da Provincia de Buenos Aires, cujo governador, o general Ibérico Saint Jean, declarou em 1977: "Primero mataremos a todos los subversivos, luego mataremos a todos sus colaboradores, después... a sus simpatizantes, enseguida... a aquellos que permanecen indiferentes y, finalmente, mataremos a los tímidos" [International Herald Tribune, París, 26 de mayo de 1977]. Julio López não morreu e em 1986, depois da ditadura, Miguel Etchecolatz foi julgado e condenado a 23 anos de prisão por crimes contra os direitos humanos. Seu julgamento foi anulado graças a lei “Obediê

Chegaremos lá?

Mais duas semanas de campanha eleitoral nesse nível e acho que sim...

De um Mineiro sobre buracos cavados na terra

E já que a moda agora é falar de mineiros saindo de dentro da terra, eis o "Áporo" do mineiro Drummond, que escreveu sobre um tempo tão ou mais escuro do que este em que vivemos agora:
 Um inseto cava 
cava sem alarme 
perfurando a terra 
sem achar escape.

 Que fazer, exausto,
 em país bloqueado, 
enlace de noite
 raiz e minério? 

 Eis que o labirinto
 (oh razão, mistério) 
presto se desata:

 em verde, sozinha,
 antieuclidiana, 
uma orquídea forma-se.

Delírios de Cafeína, ou Porque Bob Dylan e Chico Buarque têm tudo a ver

Eu prometi aos meus bilhões de leitores e agora cumpro. Eis aqui outra canção de Bob Dylan que me lembra o mesmo "esquema" de várias canções do Chico Buarque. Estão aqui: 1. a circularidade da letra que sempre volta para bater no verso que dá título a canção, reforçado pela sequência de acordes que termina no verso e começa de novo; 2. uma derivada sem tiques modernosos nem distanciamento irônico de uma tradição musical nacional, no caso Dylan bebe no Folk e no Country como Chico bebe no samba carioca; 3. um clima de romantismo meio decadente de cabaré alemão, completo com neon, hotel fajuto e marinheiros na calçada; 4. uma fossa de arrebentar bem no meio cinzento dos anos 70; 5. a rima fixa, perfeita, quase mecânica às vezes carrega de sentido a letra meio non-sense e assim "she was born in Spain / and I was born too late" parece fazer todo o sentido e ao mesmo tempo parece debochar um pouco do clima romântico; 6. e finalmente, Dylan tem uma voz bem melhor, mas mes

Editorial é viver Greatest Hits - Editorial da FSP de 1971

Li texto escrito para o ombudsman da FSP em que o autor expressa sua "decepção" com o jornal que sempre esteve ao lado da democracia nos momentos importantes da redemocratização do Brasil. Quando as vans da Folha de São Paulo, que apoiavam a Operação Bandeirantes, foram atacadas pela resistência armada à ditadura, o dono da Folha escreveu um editorial furioso, do qual destaco apenas um trecho: "Como o pior cego é o que não quer ver, o pior do terrorismo é não compreender que no Brasil não há lugar para ele. Nunca ouve. E de maneira especial não há hoje, quando um governo sério, responsável, respeitável e com indiscutível apoio popular, está levando o Brasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça social - realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, e que o mundo todo reconhece e proclama. O país, enfim, de onde a subversão - que se alimenta do ódio e cultiva a violência - está sendo definitivamente erradicada, com o decidido apoio do povo e da

Quarta e última observação sobre George Washington depois de ler um artigo sobre as suas diversas biografias

• Ao editar as cartas e diários de Washington, Sparks também trocava expressões que lhe pareciam inapropriadas e chegava a reescrever frases inteiras que, para ele, não condissessem com a figura pública do grande presidente general. Por exemplo, se Washington se referia em seu diário ao general Putman como “Old Put”, Sparks trocava o “Old Put” por “General Putman”. Outro exemplo: quando Washington se refere a uma quantia irrisória como “a fleabite” [uma picada de pulga], Sparks trocava a expressão informal por “quantia totalmente inadequada para as nossas necessidades”. Quando questionado sobre o procedimento, Sparks disse que, se estivesse vivo, Washington não aprovaria a divulgação para o público em geral de coisas que tinham sido escritas por ele em um âmbito estritamente pessoal sem que se fizesse as correções como as que ele fez que conferissem a esses textos a dignidade de um estadista do porte do grande presidente. Eu sempre tendo a pensar nesse aspecto. Por exemplo,

Quatro observações sobre George Washington depois de ler um artigo sobre as suas diversas biografias:

• Jared Sparks, editor do espólio e primeiro biógrafo do primeiro presidente americano, publicou Life and Writings of George Washington em nada menos que 12 volumes. O que não quer dizer que Sparks não fosse seletivo: dizem que ele simplesmente jogou fora cartas trocadas entre Washington e pessoas consideradas por ele desimportantes. Com a explosão do interesse por biografias e da produção desse tipo de livro, Sparks reclamava sobre a “propensão infeliz” das pessoas de perderem seu tempo escrevendo e lendo biografias sobre gente que, durante suas vidas, nunca deixaram qualquer impressão na vida pública além de um círculo estreito de amigos e parentes e nunca estenderam sua influência além das fronteiras das cidades onde viviam. O historiador Herbert B. Adams foi bem mais seletivo e publicou The Life and Writings of Jared Sparks em apenas 2 volumes.

Quatro observações sobre George Washington depois de ler um artigo sobre as suas diversas biografias 2

[o que se esconde por trás daqueles lábios enigmáticos? Dentes tortos ou uma dentadura feita de dentes de escravos?] 2• George Washington era reconhecido pelos seus contemporâneos como um homem forte e belo, de uma presença física naturalmente impressionante. Bom, como nasceu muito antes do botox e da lipoaspiração, fora um improvável espartilho e uma bosa dose de banha de porco no cabelo, a presença física de Washington devia ser mesmo natural, exceto pelos seus dentes. Dizem que Washington tinha os dentes péssimos até ele mandar fazer uma dentadura com marfim e alguns dentes arrancados de seus escravos. Podemos supor, portanto, que entre os tais direitos inalienáveis de todos os homens não se incluía o direito de manter seus dentes saudáveis na boca.

Amanhã eu continuo com Washington

Comentando a charge sutil do Laerte que vc pode ver aqui , chamo a atenção para duas coisas, a meu ver, fundamentais: 1. Tiririca, como Clodovil e Frank Aguiar antes dele, foram eleitos em São Paulo, estado mais rico e desenvolvido do Brasil. A associação da pobreza com o voto ao Tiririca é, portanto, altamente suspeita. Há poucos dias a Rede Globo entrevistou uma série de seus atores mais conhecidos respondendo de forma patética a perguntas simples como a duração do mandato de senador ou a existência de segundo turno para a eleição de senadores. Não me parece que os galãs da Rede Globo, em geral, pertençam às classes C e D. 2. Reclamar dos eleitores quando uma eleição não tem o resultado que a gente gostaria é um equívoco. Há que se registrar a indiferença ou hostilidade do eleitorado aos valores que a gente defende e lutar para informar esse eleitorado. Coisa difícil em face do monopólio de fato exercido pela mídia conservadora. Devemos lutar por uma mídia plural, onde p

Quatro observações sobre George Washington depois de ler um artigo sobre as suas diversas biografias:

Ilustração: Litografia de 1853 chamda "Life of George Washington - The Farmer". Podemos ver Washington dar um tempo na vigilância dos seus "empregados" que aproveitam para beber um copinho d'água. Ou vice-versa. Note que o bastão que ele leva à mão é meio curto para ser usado como uma bengala. Para que serviria? Talvez os escravos soubessem... 1• Antes e depois de ser presidente dos Estados Unidos, país cuja declaração de independência falava que “all men are created equal, that they are endowed by their Creator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness”, George Washington tinha fazendas com escravos, escravos que ele acabou libertando – apenas após a sua morte, através do seu testamento. Ainda assim ninguém, que eu saiba, nunca apontou para essa e outras contradições que, suponho, fariam da república americana mais um caso de idéias fora do lugar – pelo menos até o cumprimento do testamento. Mas talve