É natural que gostemos mais de certos artistas por causa de uma afinidade particular com um determinado tipo específico de arte. É natural, por exemplo, que gostemos, uns mais de Pollock, outros mais de Mondrian ou uns mais de Pollock e Mondrian e outros de Warhol, etc. E pode ser divertido se sentar na mesa do bar e discutir sobre essas nossas afinidades. Mas a crítica jornalística precisa levar outras coisas em conta, principalmente quando se dispõe a julgar o mérito do trabalho de um artista. Para começo de conversa, o crítico precisa explicitar se quer identificar e avaliar um projeto estético em si ou se quer julgar o mérito de um Mondrian ou um Pollock ou um Warhol dentro dos parâmetros que eles escolheram ou desenharam para si mesmos. Confundindo essas duas coisas completamente diferentes, a crítica jornalística tem muito pouco a acrescentar além do óbvio. Por exemplo, é um exercício banal e pouco instrutivo, mas comum, criticar um Spielberg com as balizas de um Bergman ou vice-versa. O resultado é invariavelmente o mesmo: um sentencia que Spielberg é frenético, pouco reflexivo, maniqueísta e usa truques baixos de retórica emocional e o outro diz que Bergman é um “chato”, lento demais, insistindo em um enredo “frouxo” sem grandes interesses e desprovido de suspense e portanto sem algo que prenda de fato a audiência. Vamos para a poesia e vemos um sujeito dizer que um certo poema concreto articula um discurso superficial e insuficientemente crítico enquanto outro chama um poema da poesia marginal de prosaico, hedonista, inconsequente. Ler Chacal com a baliza de Castro Alves é um gesto tão fútil quanto ler João Cabral ou Castro Alves com a com a baliza de Chacal. Que sentido tem reclamar da “pobreza das harmonias e melodias” de uma banda Punk? Para que eu perderia o meu tempo lendo sobre isso? Não parece tudo tão óbvio? Para que então eu perder meu tempo escrevendo sobre isso? Ora, basta ler a crítica de jornal com certa regularidade para perceber que parte da crise da mesma se deve à irrelevância em que ela acaba caindo por causa de um mar de obviedades, isso para não falar de “debates” que partem dessa confusão entre o mérito de uma proposta e o mérito de uma obra específica e degeneram rapidamente para uma troca de impropérios deprimente. Nada contra a veemência, mas é preciso ser veemente sobre alguma coisa consistente. Essa tendência ao bate-boca vazio deixa a impressão de que todos gritam muito alto para esconder o fato de que não estão dizendo nada.
Monteiro Lobato conta em "O engraçado arrependido" a história trágica de um homem que não consegue se livrar do papel de palhaço da cidade, papel que interpretou com maestria durante 32 anos na sua cidade interiorana. Pontes é um artista, um gênio da comédia e por motives de espaço coloco aqui só o miolo da introdução em que o narrador descreve o ser humano como “o animal que ri” e descreve a arte do protagonista: "Em todos os gestos e modos, como no andar, no ler, no comer, nas ações mais triviais da vida, o raio do homem diferençava-se dos demais no sentido de amolecá-los prodigiosamente. E chegou a ponto de que escusava abrir a boca ou esboçar um gesto para que se torcesse em risos a humanidade. Bastava sua presença. Mal o avistavam, já as caras refloriam; se fazia um gesto, espirravam risos; se abria a boca, espigaitavam-se uns, outros afrouxavam os coses, terceiros desabotoavam os coletes. E se entreabria o bico, Nossa Senhora! eram cascalhadas, eram rinchavelhos, e...
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