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Recordar é viver: os 2 desaparecimentos de Jorge Julio López [27-10-76 > 18-09-06]

Parte 2. “Una noticia, por mala que sea”

Em 2003 as lei “Ponto Final” e “Obediência Devida” e os indultos de Menem foram anulados na justiça e no congresso com o apoio do novo presidente Kirchner. Em 2004 Etchecolatz pegou 7 anos pelo crime de roubo de bebês de prisioneros politicos, mas Etchecolatz foi mandado a cárcere privado, sob protestos veementes dos organismos defensores dos direitos humanos na Argentina.

Em 2006 as leis de proteção aos criminosos da ditadura argentina tinham sido definitivamente derrubadas e Etchecolatz estava sendo novamente julgado pelo crime de genocídio, no dia 28 de junho de 2006 Julio López era uma das testemunhas de acusação. Aqui podemos ver algumas partes do testemunho de Julio López no julgamento de Etchecolatz:




Acho o testemunho em si fortíssimo, talvez dispensando comentários, mais forte quando se pensa no seu desaparecimento pouco depois, ao fim do julgamento, Etchecolatz foi condenado a prisão perpétua. Mas Julio López não assistiu a leitura da sentença, um momento catártico para muitos argentinos: desapareceu no dia 18 de setembro de 2006 em La Plata trinta anos depois de seu sequestro pelo regime militar argentino. Até hoje López não foi encontrado. O título dessa segunda parte do post é parte de um apelo feito pela família de Julio López.

PS. Tenho que citar uma pessoa que conheci ano passado por intermédio da minha companheira de trabalho Moira Fradinger: a viúva do cineasta argentino desaparecido Raymundo Gleyzer, Juana Sapire que, em uma conversa informal, me contou sobre o caso de Julio López, quando eu disse que agora a Argentina era uma democracia. Os brasileiros precisam conhecer muito melhor o resto da América Latina e a Argentina, por exemplo, para conhecer Gleyzer, um documentarista SENSACIONAL que começou sua carreira filmando no nordeste brasileiro em 1964. Para isso vale a pena conferir o documentário sobre Gleyzer.


Comments

Flávia Cera said…
Paulo,

obrigada por compartilhar essa história que, embora seja muito triste, é reveladora e fundamental para entendermos o estado das coisas no nosso presente tão distante e tão perto das Ditaduras. Um abraço.
Obrigado pela presença, Flávia. Dadas as devidas proporções [a guerra suja na Argentina pode ser mesmo entendida como um genocídio], eu acho que esses problemas poderiam estar nos afetando hoje também. Mas nós preferimos empurrar para debaixo do tapete o que aconteceu e esperar que as pessoas que torturaram e assassinaram em nome do estado morram de velhas [e de preferência em silêncio], sem perceber que a partir de 1964 e principalmente de 1968, nós abrimos o precedente para o que acontece hoje nas prisões, nas delegacias, nas mílicias cariocas, nas "guerras" contra o tráfico, etc. E o pior de tudo, abrimos as portas para o que eu chamo de "cultura do extermínio", um fascismo tupiniquim disfarçado de moralismo que termina, por exemplo, em 111 pessoas fuziladas no Carandiru e na eleição do comandante desse massacre a deputado estadual com o número 11190. Quando as pessoas falam em "tolerância zero" no Brasil, o modelo, consciente ou não, é a Operação Bandeirante.
Você assistiu ao documentário "Cidadão Boilesen"? Sinto falta de mais filmes como esse.

Há alguns anos foram feitos muitos filmes (documentários e ficção) sobre guerrilheiros e tal. Acho que se repete o mesmo mecanismo de discurso sobre a pobreza: o cinema brasileiro mostra muito os pobres e seus problemas, mas pouco os ricos, e sua relação com isso (de maneira adulta, e não melodramática).

No caso das vítimas do regime militar, acho que falta material sério sobre os perseguidores e suas relações.
Puxa, que coincidência vc falar desse filme! O diretor, Chaim Litewski, mora em Nova Iorque e esteve aqui em Yale mês passado, apresentando e discutindo o filme em um festival de cinema iberoamericano.

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