Skip to main content

Poesia Minha - Quinnipiac


[Foto: vista do rio Quinnipiac em New Haven. Do lado de cá o bairro latino e as fábricas abandonadas. Do lado de lá, mais do mesmo...]


Eu não costumo escrever poesia em inglês, mas apareceu um concurso numa livraria da minha cidade - iam dar um prêmio em vale-livros e pendurar o poema no café da livraria - e eu resolvi que queria concorrer.

Adoro esse trecho do rio Quinnipiac, cortando a cidade pouco antes de chegar ao mar. Há quem diga que o rio Charles [que passa perto de Harvard], rio que tem papel importante na parte narrada por Quentin Compson em The Sound and the Fury é na verdade o Quinnipiac, que Faulkner conhecia de perto por ter passado um tempo sapeando por New Haven. Misturei nesse caldo ainda uma pitada de Clarice Lispector e meia xícara de Guimarães Rosa, cujos contos estava ensinando em inglês nesse longo e tenebroso inverno que passou, e deu nisso aí.

Bom, terminei o trem uns cinco dias antes do prazo e fui cuidar da minha vida. Quando vi, deixei passar o prazo do concurso e não concorri a nada.


Quinnipiac

This was where I saw the river for the last time this morning, about here.

The Sound and the Fury

the last lights

supine and tranquil

pieces of broken mirror

glinting beyond things

its curves out of sight

beyond the twilight

beyond the dusk

the water

lights in the pale clear air trembling

a little like butterflies


I cross the Quinnipiac

the bridge arches slow

high between silence and nothingness


on the other side

all laid before me

cleansed of everything else

the food

not its name

in the name of nothing

in the name of nobody

empty of dreams

there was no sacrifice

hunger born

just as the ripe fruit

reach the open mouth


but it was also death

and I trembled down deep

and I turned away

and I ran away


that was the cold that comes with fear

this is the illness

in the droplet almost impalpable

the immense edifice

the old scars itching

the three cheers to resentment

spilled on the table

a million forms of solitude

everywhere in the house

something in the light itself

strongest until I lie in bed thinking

the draft in the door

a damp steady breath of water

when it blooms and rains in the spring


now I’m the one who never was

but hear me out

when I am dead and gone

lay me right smack in the middle

of the big deep quiet unceasing water

the deep undercurrent

between the two long cold endless banks

the third bank of this river

so far so wide apart

then I down the river

out in the river into the river

I, the Quinnipiac.

Comments

gostei, embora seja muito estranho ler algo em ingles escrito por um brasileiro. (em geral) com exceção do clássico "feelings", claro.

a proposito, uma amiga me contou que tem uma moda das jovens moderninhas em são paulo de conversar misturando frases em ingles. que medo.
Eu escrevo no trabalho em inglês mas aí é outra história, né?
Agora essa novidade das modernetes de São Paulo... deve ser ótimo para se acompanhar aqueles baldes de café queimado que eles servem no estarbãques!

Popular posts from this blog

Contos: "O engraçado arrependido" de Monteiro Lobato

Monteiro Lobato conta em "O engraçado arrependido" a história trágica de um homem que não consegue se livrar do papel de palhaço da cidade, papel que interpretou com maestria durante 32 anos na sua cidade interiorana. Pontes é um artista, um gênio da comédia e por motives de espaço coloco aqui só o miolo da introdução em que o narrador descreve o ser humano como “o animal que ri” e descreve a arte do protagonista: "Em todos os gestos e modos, como no andar, no ler, no comer, nas ações mais triviais da vida, o raio do homem diferençava-se dos demais no sentido de amolecá-los prodigiosamente. E chegou a ponto de que escusava abrir a boca ou esboçar um gesto para que se torcesse em risos a humanidade. Bastava sua presença. Mal o avistavam, já as caras refloriam; se fazia um gesto, espirravam risos; se abria a boca, espigaitavam-se uns, outros afrouxavam os coses, terceiros desabotoavam os coletes. E se entreabria o bico, Nossa Senhora! eram cascalhadas, eram rinchavelhos, e...

Poema meu: Saudades da Aldeia desde New Haven

Todas as cartas de amor são Ridículas. Álvaro Campos O Tietê é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia, mas o Tietê não é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia porque não corre minha aldeia. Poucos sabem para onde vai e donde vem o ribeirão da minha aldeia, 
 que pertence a menos gente 
 mas nem por isso é mais livre ou menos sujo. O ribeirão da minha aldeia 
 foi sepultado num túmulo de pedra para não ferir os olhos nem molhar os inventários da implacável boa gente da minha aldeia, mas, para aqueles que vêem em tudo o que lá não está, 
 a memória é o que há para além do riberão da minha aldeia e é a fortuna daqueles que a sabem encontrar. Não penso em mais nada na miséria desse inverno gelado estou agora de novo em pé sobre o ribeirão da minha aldeia.

Uma gota de fenomenologia

Esse texto é uma homenagem aos milhares de livrinhos fininhos que se propõem a explicar em 50 páginas qualquer coisa, do Marxismo ao machismo e de Bakhtin a Bakunin: Uma gota de fenomenologia Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele p...