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Recordar é viver: Transporte público e segregação racial/econômica



“They seem to think we're animals or something. They just don't want us to be able to get the kind of education they've already got.”

12 de Setembro de 1974.

Margie, estudante negra que passou a frequentar a South Boston High School.


Essa história de não querer estação de metrô em Higioenópolis me lembra um dos momentos mais tristes da segunda metade do século XX nos Estados Unidos: a criação de um grupo em Boston chamado "Restore Our Alienated Rights (ROAR)" para combater a desegregação racial das escolas públicas através do sistema de ônibus escolares que levavam crianças dos bairros mais pobres [em geral negros] para ter aulas nas escolas públicas dos bairros ricos [em geral brancos]. [Aliás guarde bem essa história para jogar na cara de qualquer americano que tentar te convencer que o sul é o único vilão quando se trata de problemas raciais nos Estados Unidos.]

Uma breve explicação primeiro. As escolas públicas primárias e secundárias nos Estados Unidos costumam funcionar numa espécie de sistema distrital. Nesse sistema os distritos onde mora gente rica financiam com seu IPTU alto escolas públicas de primeira qualidade enquanto nos distritos pobres, onde a maioria das pessoas mora de aluguel e os impostos são mais baixos, os alunos que precisariam de mais ajuda por problemas diversos [problemas com drogas, pais com baixo nível de educação e dois ou três sub-empregos que não podem ajudar os filhos em casa, desemprego alto, etc] e necessidades especiais [por exemplo, um grande número de alunos que chegam à escola sem falar uma palavra de inglês]. Daí a decisão de desegregar as escolas públicas levando os alunos de ônibus para escolas que não funcionariam como escolas de bairro mas como escolas com especializações diferentes.

O ROAR, criado por uma vereadora de Boston [Louise Day Hicks] para “proteger os direitos ameaçados dos brancos”, ganhou força pelo apoio tácito de figuras importantes de Boston como John Kerrigan, presidente na época Boston School Committee, que se opuseram à desegregação de Boston em público de forma enfática. Kerrigan dizia que a desegregação causaria o famigerado “white flight”, a fuga em massa das famílias de classe média e alta [brancas] de Boston para os subúrbios. Assim, entre 1974 e 1977, o pau comeu em Boston. Theodore Landsmark, advogado com cara de “diferenciado” [ele era presidente da associação dos construtores de Boston] deu azar de cruzar com um bando de jovens moradores de South Boston no centro da cidade e foi brutalmente atacado:


Outras fotografias menos famosas da época podem ser vistas aqui

Um livro compara a situação em Boston e Buffalo [cidade do estado de Nova York] e enfatiza que a atuação das autoridades em Buffalo foi fundamental para que o processo de desegregação das escolas nessa cidade corresse de maneira muito menos traumática do que em Boston. Nem Hicks nem Kerrigan jogaram pedra em ninguém, mas botaram lenha na fogueira dos ódios raciais da cidade. Nem Edward Kennedy escapou da fúria dos irlandeses de Boston. Tomara que as autoridades da cidade tratem o assunto com calma e tranquilidade e que as antas bolsonárias não dêem o ar de sua graça.

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