Skip to main content

Recordar é viver: refugiados e xenofobia


-->
Robert Reynolds

Num discurso feito na “American Defense Society” em maio de 1939 no hotel Astor na cidade de Nova Iorque, o senador pela Carolina do Norte Robert Reynolds condenou a proposta chamada Wagner-Rogers Bill, que seria derrotada no congresso pouco depois. A proposta teria permitido a entrada de 20.000 crianças refugiadas da Europa nos Estados Unidos.

Para que se tenha a perspetiva exata da postura de Reynolds, há que se lembrar que a famigerada “Noite dos Cristais” tinha acontecido há apenas 6 meses. Durante a Noite dos Cristais 30.000 judeus foram mandados para campos de concentração e 267 sinagogas foram queimadas em dois dias de delírio nazista.

Reynolds não representava a opinião da minoria. Uma pesquisa da Gallup naquele ano de 1939 indicava que 67% dos perguntados se opunham a receber mais refugiados da Europa.

Kristallnacht
Dois anos mais tarde, no dia 5 de junho de 1941, o mesmo Robert Reynolds usava a tribuna do senado para fazer um discurso inflamado onde afirmava:

I wish to say — and I say it without the slightest hesitation — that if I had my way about it at this hour, I would today build a wall about the United States so high and so secure that not a single alien or foreign refugee from any country upon the face of this earth could possibly scale or ascend it.

I believe we must rid our country of the alien enemies who are now here, and put up the bars so that from now on no alien of any nationality upon the face of the earth will be permitted to enter the United States...

I say we should stop — and stop now — the refugees who are seeping into this country by the thousands every single month to take the jobs which rightly belong to the native-born and naturalized citizens of the United States.

Gostaria de afirmar hoje – e o faço sem qualquer hesitação – que à essa altura se eu pudesse fazer as coisas do meu jeito, eu construiria hoje mesmo um muro em volta dos Estados Unidos, um muro tão alto e tão seguro, que nenhum forasteiro ou refugiado estrangeiro de qualquer país na face da terra poderia ultrapassar ou escalar.

Acredito que devemos livrar nosso país de inimigos estrangeiros que aqui estão agora, and construir as barreiras de forma que a partir de agora nenhum estrangeiro de qualquer nacionalidade será admitido nos Estados Unidos…

Digo que devemos impedir – e impedir já – que os refugiados que têm se infiltrado no nosso país aos milhares todos os meses ocupem os postos de trabalho que pertencem por direito ao cidadãos nativos ou naturalizados dos Estados Unidos.

Machado de Assis
Fica difícil saber ao certo, mas, entre relutâncias e hostilidades xenófobas de vários outros países [inclusive o Brasil], quantas vidas terão sido atiradas na fogueira do nazismo? Milhares, certamente. Menos de um século depois, refugiados do Iêmen, Síria, Iraque, Venezuela, Haiti, Congo, Somália, Moçambique e muitas outras partes do mundo voltam a encontrar relutância e hostilidade.

Parafraseando o refrão de conto de Machado de Assis [“Na Arca”] escrito sob o impacto do conflito entre Rússia e Turquia no fim do século XIX:

continuamos a boiar sobre as águas do abismo.


Mais detalhes sobre a carreira de Reynolds [em inglês] aqui. O conto de Machado de Assis você encontra aqui



Comments

Popular posts from this blog

Diário do Império - Antenado com a minha casa [BH]

Acompanho a vida no Brasil antes de tudo pela internet, um "lugar" estranho em que a [para mim tenebrosa] classe m é dia brasileira reina soberana, quase absoluta, com seus complexos, suas mediocridades e sua agressividade... Um conhecido, daqueles que ao inv és de ter um blogue que a gente visita quando quer, prefere um papel mais ativo, mandando suas "id éias" para os outros por e-mail, me enviou o texto abaixo, que eu vou comentar o mais sucintamente possível: resolvi a partir de amanh ã fazer um esforço e tentar, al ém do blogue, onde expresso minhas "id éias" passivamente, tentar me comunicar diretamente com as pessoas por carta... OS ALUNOS DE UNIVERSIDADES PARTICULARES DERAM UMA RESPOSTA; E A BRIGA CONTINUOU ... 1 - PROVOCAÇÃO INICIAL Estudar na PUC:............... R$ 1.200,00 Estudar no PITÁGORAS:..........R$ 1.000,00 Estudar na NEWTON:.....R$ 900,00 Estudar na FUMEC:............ R$600,00 Estudar na UNI-BH:........... R$ 550,00 Estudar na

Uma gota de fenomenologia

Esse texto é uma homenagem aos milhares de livrinhos fininhos que se propõem a explicar em 50 páginas qualquer coisa, do Marxismo ao machismo e de Bakhtin a Bakunin: Uma gota de fenomenologia Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele p

Protestantes e evangélicos no Brasil

1.      O crescimento dos protestantes no Brasil é realmente impressionante, saindo de uma pequena minoria para quase um quarto da população em 30 anos: 1980: 6,6% 1991: 9% 2000: 15,4%, 26,2 milhões 2010: 22,2%, 42,3 milhões   Há mais evangélicos no Brasil do que nos Estados Unidos: são 22,37 milhões da população e mais ou menos a metade desses pertencem à mesma igreja.  Você sabe qual é? 2.      Costuma-se, por ignorância ou má vontade, a dar um destaque exagerado a Igreja Universal do Reino de Deus e ao seu líder, Edir Macedo. A IURD nunca representou mais que 15% dos evangélicos e menos de 10% dos protestantes como um todo. Além disso, a IURD diminuiu seu número de fiéis   nos últimos 10 anos de acordo com o censo do IBGE, ao contrário de outras denominações, que já eram bem maiores. 3.      Os jornalistas dos jornalões, acostumados com a rígida hierarquia institucional católica não conseguem [ou não tentam] entender muito o sistema