Delaware é o segundo menor estado dos Estados Unidos. Com uma população de 960.000 pessoas, Delaware tem 1.3 milhão de corporações. Praticamente a metade das corporações estadunidenses tem sede registrada lá. 68% das 500 maiores empresas. Como a questão das leis corporativas é estadual, Delaware não cobra imposto de renda das empresas que, apesar de instaladas por lá, não tem negócios no estado. Escândalos mundiais envolvendo bilhões de dólares, da Malasia ao Equador e Rússia contam com a participação de corporações do estado, ajudando picaretas de todos os tipos, da Goldman Sachs até a Odebrecht. As autoridades financeiras do Brasil decidiram que qualquer corporação financeira listada em Delaware está na sua lista negra, tal a má fama do estado.
Já a especialidade da Dakota do Norte, com seus 760.000 habitantes, é outra. Lá os juros são liberados e as empresas de cartões de crédito operam de lá, depenando seus clientes que se endividam com taxas escorchantes. Além de abolir o conceito de usura, a Dakota do Norte aceita fundos fiduciários – fundos que gerenciam os bens de alguém em nome dos seus herdeiros – que podem existir sem divulgar o nome dos seus fundadores, que podem ser criados e beneficiar o próprio criador deles, que podem ter todos os seus negócios fora do estado, que podem ter todos os seus documentos legais selados. Hoje esse estado praticamente rural guarda a bagatela de 367 bilhões de dólares para plutocratas que não querem pagar impostos nem prestar contas de como ganharam suas fortunas.
Bancos como HSBC, Deutsche Bank e Citibank prestam serviço a cleptocratas de todo o mundo, da família Gortari no México a família Obiang na Guiné Equatorial. Os bancos preenchem seus “Relatórios de Atividades Suspeitas” e mandam para uma agência com meros 300 funcionários no tesouro dos Estados Unidos, onde os relatórios então dormem o sono profundo dos impunes. Um vazamento recente diz que entre 1999 e 2017, 2 trilhões de dólares envolvidos nesse tipo de transação suspeita sem que ninguém fosse investigado.
E o mercado de imóveis caríssimos nos Estados Unidos, que até a crise de 2016 garantia segredo absoluto, foi inflacionado por hordas de ladrões de todos os cantos do planeta, que lavam seus milhões em Nova Iorque, Miami e outras cidades de grande porte. Quando o governo Obama, depois do desastre de 2016, exigiu que proprietários de empresas que pagavam em dinheiro vivo mais de 1 milhão por imóveis nessas cidades fossem identificados, o efeito foi imediato e devastador: 95% de queda só em Miami; 70% nos Estados Unidos como um todo.
Como é de costume nos Estados Unidos, cada aperto na fiscalização já vem cheio de buracos feito sob medida: imóveis comerciais ficaram fora da nova regra. Não há chance de passar nada sem o apoio das secretarias de estado dos estados todos, reunidos numa associação. Desde que relatem as transações a alguma agência regulatória do país, bancos, advogados, contadores e corretores estão livres de qualquer responsabilidade criminal.
Um levantamento do Banco Mundial de 2011 nos diz que 85% dos casos de corrupção de larguíssima escala envolvem esse tipo de empresa anônima, a maior parte nos Estados Unidos. Reagan e Thatcher e os seus minions espalhados pelo mundo inteiro construíram essa festa da maracutaia: os plutocratas estadounidenses pagam hoje 79% menos imposto que em 1980.
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