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Showing posts from 2025

Poesia minha

JULHO, 1969  eu nasci e ninguém mais foi à lua os sonhos encolhendo os olhos firmes abotoados no chão esperando um bilhete sorteado a justiça fútil dos ressentidos colecionando arrependimentos acreditando que quem pode  não faz manda fazer e depois não paga 

Notas sobre Notas Sobre o Suicídio de Simon Crichtley

  Para Cioran os suicidas deprimidos pecavam por ser otimistas demais.  À medida em que eu falava sobre o suicídio de um jeito melhor mais eu me sentia uma fraude por isso. 14 O uso passivo das redes sociais induz fatiga, solidão, depressão, uma espécie de ennui  setecentista à moda de Pascal e a sensação de que nossas vidas são inadequadas e sem sentido em comparação com a maré crescente de glamour artificial, fúria moralista e falsidades que nos assaltam continuamente pelas telas dos telefones. 18 Estação do ano em que o suicídio cresce: Primavera. Dia da semana: segunda-feira.  "Eu quero observar o suicídio de perto, com cuidado e quem sabe com certa dose de frieza, sem me lançar a julgamentos ou princípios morais como o direito à vida ou à morte. 27 O suicídio nos faz ao mesmo tempo estranhamente reticentes e excepcionalmente falantes; nos faltam e nos sobram palavras ao mesmo tempo. 31 Talvez a nossa experiência mais próxima da morte seja a escrita, no sentido d...

Notas para livros impossíveis

 Quem ousará reclamar da soberba dos outros quando ele mesmo não dispõe de um momento para si? Sêneca Nada a esconder. O mundo não tem nada a esconder. Somos nós que não vemos. Gabriel Orozco

Leitura Cerrada

 A coisa mais valiosa que eu aprendi quando saí do Brasil para estudar (e depois trabalhar) foi algo que eu descreveria como uma técnica de leitura. Uma prática, primeiro, de leitura e, depois, de escrita persuasiva. Para ser justo, fui apresentado a ela ainda na UFMG, mas só porque me formei no bacharelado em literatura de língua inglesa com muitos professores que tinham sido treinados nos Estados Unidos. Me explico: essa técnica de leitura é absolutamente central no mundo de língua inglesa, sendo praticado por aqui de forma contumaz desde o ensino médio em todas as aulas que envolvam literatura e escrita na língua inglesa.  Enquanto isso no Brasil (no meu tempo de aluno pelo menos), era um esforço fútil e absurdo de tentar enquadrar textos dentro de uma lista escolas e estilos de época, normalmente descritos de uma forma tão vaga e formalista que chega a produzir textos didáticos que são simplesmente surreais. Um exemplo: O  parnasianismo  é definido como uma escol...

Livros de notas

"As ruas juntaram tanta poeira que o homem não teve escolha a não ser passar a existir, para varrê-las."  Victor Heringer, 11 "Não é uma vestimenta que eu jogo fora hoje, mas uma pele que eu arranco com as próprias mãos."  Kahlil Gibran, 5

Trump foi eleito POR CAUSA e não apesar do seu racismo.

Em 1973, o governo federal do republicano Nixon processou Donald Trump por discriminar negros na cobrança de aluguéis dos seus imóveis. Em 1980, um ex-empregado disse que todos os empregados negros do cassino de Trump  eram removidos da vista do proprietário quando ele visitava o cassino. Em 1989, cinco adolescentes foram acusados de agredir e estuprar uma mulher no Central Park e Trump pagou um anúncio de página inteira nos principais jornais de Nova Iorque pedindo a pena de morte para os cinco acusados (quatro negros e um latino). Exames de DNA exoneraram os cinco. Dois anos depois o ex-diretor do cassino e hotel de Trump disse que o chefe dizia que pessoas negras eram geneticamente preguiçosas. Em 1997, Trump afirmou que o livro do ex-empregado era veraz. Em 1992, o cassino de Trump foi multado em 200,000 dólares por forçar clientes negros a sair de certas mesas de apostas em atenção a um grande apostador racista. No ano 2000, Trump patrocinou anúncios que acusavam a tribo Mohaw...

Não pode ou não quer?

Parar de trabalhar agora? Parar de comer comida merda? Parar de beber Coca-Cola TODOS os dias? Escrever dois livros? Perder 20 quilos? Fazer alongamento TODOS os dias? Terminar meu livro de ficção? Publicar minhas traduções? Trabalhar no meu jardim?

A Liberdade e a Tutela do Liberalismo - John Stuart Mill

John Stuart Mill é uma espécie de santo padroeiro do liberalismo no âmbito da língua inglesa. Vejam, por exemplo, como se derrama o colunista Adam Gopnik na revista New Yorker logo na aberta de um artigo sobre o pensador inglês: "Com certeza ninguém nunca teve razão sobre tantas coisas diferentes por tanto tempo como John Stuart Mill, o filósofo, político e sabe-tudo-mor da Inglaterra no século XIX."  Uma boa forma de introdução ao pensamento político/filosófico de Stuart Hill é o primeiro capítulo do livro "Sobre Liberdade". Ali ele fala sobre três pilares da liberdade: a liberdade de consciência, a liberdade de decidir livremente o que fazer com a própria vida [desde que não se prejudique ninguém] e a liberdade de associação [desde que todos os membros tenham escolhido juntar-se].  Frequentemente ignorada é uma frase, a meu ver importantíssima daquele texto introdutório: "O despotismo é uma forma legítima de governo quando se trata de bárbaros, desde que seu ...

Música: Head of the Lake de Leanne Betasamosake Simpson

  Head of the Lake Lyrics by Leanne Betasamosake Simpson* Music by Nick Ferrio, Jonas Bonnetta, Ansley Simpson In a basement full of plastic flowers, Pierogis, cabbage rolls. At the head of the lake, thinking under accusation. At the mouth of the catastrophic river, Disappearing our kids. At the foot of the nest Beside trailer hitches, coffee, spoons. We made a circle And it helped. The smoke did the things we couldn’t. Singing broke open hearts, I hold your hand Without touching it. We’re in the thinking part of the lake. Faith under accusation At the mouth of the river. And the spectre of the free At the foot of Animikig** Beside bones of stone and red silver In a basement full of increasing entropy, Moose ribs, wild rice. ( We made a circle ) We made a circle ( We made a circle ) And it helped ( And it helped ) The smoke did the things we couldn’t ( The smoke did the things we could not ) Singing broke open hearts I hold your hand without touching it ( I hold your hand without t...

Sessenta anos: Martin Luther King Jr., gênio da retórica na sua cultura

1. Concordo com Benedict Anderson em ver na imaginação a cola que mantém uma nação minimamente coesa. 2. Somos um animal coletivo narcisista e por isso imaginamos comunidades nacionais criando mitos fundamentalmente positivos. 3. Falo dessa imaginação mítica [ainda com a mesma sanha sintética] em dois lugares que conheço intimamente: Nos Estados Unidos, o mito de ser um ícone luminoso da liberdade produtiva; no Brasil, o mito de ser um ícone luminoso da afetividade prazeirosa. 4. Nenhum mito é simplesmente uma mentira. Os mitos, como os estereótipos, têm poder porque vão buscar em alguma realidade a medula da sua construção fundamentalmente fantasiosa. 5. Entendi mais firmemente o gênio retórico de MLK, lendo a fantástica carta aberta que ele escreveu em abril de 1963 (há 60 anos) no xilindró em Birmingham, Alabama. A carta se dirige ostensivamente a outra carta aberta, publicada no jornal local por líderes religiosos, condenando as manifestações que lançaram o "Projeto C" (...

Trinta Anos: O monstro que hoje está no poder levanta sua face mais feia

 No dia 19 de abril de 1995 um atentado de extrema direita na cidade de Oklahoma City (há vinte minutos de onde eu moro) destruiu o edifício Alfred Murrah. Um carro cheio de explosivos feitos com três toneladas de fertilizante e diesel foi estacionado em frente ao prédio e detonado às nove da manhã. 168 pessoas morreram, entre elas 19 crianças que frequentavam uma creche no prédio, e 800 ficaram feridas. O prédio foi escolhido porque lá havia agências do governo federal. Sinceramente, sem retoques, a gente que explodiu o Murrah em 1995 chegou ao poder trinta anos depois. As ideias extermistas de Timothy McVeigh e Terry Nichols hoje estão no poder.  Salve-se quem puder!

Saudades

 Primeiro aniversário sem a minha mãe.  Leio sobre os americanos de ascendência japonesa que foram levados à campos de concentração nos Estados Unidos. O autor pergunta aos descendentes daqueles que foram aprisionados em seu próprio país só por causa da sua etnia na Segunda Guerra Mundial, "onde é que você vai para estar em contato com os seus antepassados".  Algumas das respostas: no ar na água na terra na natureza perto de água corrente em momentos de quietude  num jardim com pedras     E eu? Onde é que eu me encontro com a minha mãe?  Minha mãe passou os seus últimos anos muito mal: incapaz de usar as mãos e os pés e com apenas breves momentos de consciência. Foram anos difíceis para nós mas muito mais duros para ela, uma pessoa sempre ativa, que se ocupava com mil coisas o tempo todo.   Vou estar com a minha mãe então nas fotos que tenho aqui comigo dela antes desse período difícil. Muitas delas são fotos de antes de eu nascer [minha mãe era d...

Novos [velhos] tempos

 A pior face do conglomerado homogeneizador Netflix é, de longe, os documentários produzidos e/ou promovidos pela plataforma. São quase todos sensacionalistas, esteticamente e epistemologicamente obsoletos. Eles reproduzem o pior da TV a cabo. De um lado, documentários que pretendem "dizer a verdade" sobre "casos" notórios: Flodelis, João de Deus, a mulher que esquartejou o marido, a filha que matou os pais, etc. Do outro lado, documentários que pretendem "dizer a verdade" sobre assuntos "científicos", principalmente de saúde: "curas" para o autismo ou o câncer, "verdades" sobre o funcionamento do cérebro humano etc.  O curioso é que, quando o Netflix entrou no mercado dos EUA, não era como uma plataforma, mas como uma espécie de videolocadora online. Sem a exigência de ter lojas físicas [os DVDs eram enviados pelo correio já com um envelope pronto para o retorno pelo mesmo correio], o acervo era muitíssimo maior do que qualqu...

Narcisismo e Morte nas Redes Sociais

 Num jornal vejo uma "notícia" sobre uma celebridade que posta numa rede social fotos do seu cachorro de estimação morrendo no seu colo. Tenho um instintivo sentimento de asco. Depois penso em como usar o amor para aparecer online e mendigar cliques nas redes sociais é algo bem comum e efetivo. O que aconteceu é que a morte é um momento extremo e fica transparente a exploração da vida pessoal dos outros em nome de fama e, possivelmente, dinheiro.  Parece algo como vender roupas ou "fazer contatos" no meio do enterro do seu melhor amigo.  Essa "notícia", como expliquei, é uma versão grotesca de algo bastante comum nas redes sociais. O incomodo voltou com força hoje na minha bolha com a morte de Heloísa Teixeira (que publicou grande parte da obra com o nome de Heloísa Buarque de Holanda e era filha de Afrânio Coutinho). Multiplicam-se em vários perfis "homenagens" que, na verdade, buscam ostentar intimidade com uma pessoa famosa com o mesmo objetiv...

Ortodoxias na economia

Durante décadas , economistas e empresários estadounidenses promoveram a ideia de que aumentar o salário mínimo custaria uma redução nos empregos d os trabalhadores de baixa remuneração . O argumento justifica até hoje a manutenção do salário mínimo federal ( estabelecido há quinze anos) em US $ 7 , 25 por hora , uma taxa que é seguida por vinte dos cinquenta estados dos Estados Unidos até hoje . David Carr e Alan Krueger Na virada da década dos 80 para os 90 , o s economistas David Card e Alan Krueger compararam o número de empregos em fast - food em 400 restaurantes na Pensilvânia e em Nova Jersey logo depois que este último tinha aumentado o seu salário mínimo. Card e Krueger descobriram que, ao invés de desemprego, a medida gerou um pequeno aumento: os restaurantes em Nova Jersey sujeitos ao aumento salarial contrataram 2 , 5 funcionários a mais por loja do que os restaurantes na P...