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Reparem na dança de tempos verbais do primeiro parágrafo de “D. Paula” de Machado de Assis:
“Não era possível chegar mais a ponto. D. Paula entrou na sala exatamente quando a sobrinha enxugava os olhos cansados de chorar. Compreende-se o assombro da tia. Entender-se-á também o da sobrinha, em se sabendo que D. Paula vive no alto da Tijuca, donde raras vezes desce; a última foi pelo Natal passado, e estamos em maio de 1882. Desceu ontem, à tarde, e foi para casa da irmã, Rua do Lavradio. Hoje, tão depressa almoçou, vestiu-se e correu a visitar a sobrinha. A primeira escrava que a viu, quis ir avisar a senhora, mas D. Paula ordenou-lhe que não, e foi pé ante pé, muito devagar, para impedir o rumor das saias, abriu a porta da sala de visitas, e entrou.”
Passado nas duas primeiras sentenças, presente na segunda, futuro e presente de novo. “Estamos” em maio de 1882 [a história é publicada em 1884] e quando D. Paula veio visistar a sobrinha “hoje” voltamos ao passado. Tudo isso sem grandes alardes: isso é que eu chamaria de pirotecnia discreta. E a dança se estende aos sujeitos que aparecem e desaparecem: na primeira frase, nada. Na segunda D. Paula e a sobrinha são sujeitos que a gente observa meio de longe, num palco. Quem compreende e entenderá? O leitor, o narrador, os dois?
Li hoje um artigo John Gledson [em inglês] disponível online sobre esse conto, construído habilmente a partir das traduções para o inglês. Uma lição de estilo.
Reparem na dança de tempos verbais do primeiro parágrafo de “D. Paula” de Machado de Assis:
“Não era possível chegar mais a ponto. D. Paula entrou na sala exatamente quando a sobrinha enxugava os olhos cansados de chorar. Compreende-se o assombro da tia. Entender-se-á também o da sobrinha, em se sabendo que D. Paula vive no alto da Tijuca, donde raras vezes desce; a última foi pelo Natal passado, e estamos em maio de 1882. Desceu ontem, à tarde, e foi para casa da irmã, Rua do Lavradio. Hoje, tão depressa almoçou, vestiu-se e correu a visitar a sobrinha. A primeira escrava que a viu, quis ir avisar a senhora, mas D. Paula ordenou-lhe que não, e foi pé ante pé, muito devagar, para impedir o rumor das saias, abriu a porta da sala de visitas, e entrou.”
Passado nas duas primeiras sentenças, presente na segunda, futuro e presente de novo. “Estamos” em maio de 1882 [a história é publicada em 1884] e quando D. Paula veio visistar a sobrinha “hoje” voltamos ao passado. Tudo isso sem grandes alardes: isso é que eu chamaria de pirotecnia discreta. E a dança se estende aos sujeitos que aparecem e desaparecem: na primeira frase, nada. Na segunda D. Paula e a sobrinha são sujeitos que a gente observa meio de longe, num palco. Quem compreende e entenderá? O leitor, o narrador, os dois?
Li hoje um artigo John Gledson [em inglês] disponível online sobre esse conto, construído habilmente a partir das traduções para o inglês. Uma lição de estilo.
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