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Diário da Babilônia: Baltimore

1. Baltimore fica longe de New Haven. Assim peguei na biblioteca pública os CDs com Notas do Subsolo de Dotoievski para ir escutando no caminho enquanto os meninos escutam suas coisas nos seus fones de ouvido. Para minha surpresa, Samuel para de escutar suas coisas e começa a prestar atenção. "Esse cara pensa diferente de todo mundo, pai."

2. Meu filho ainda é uma criança: quem duvida basta ver a vibração dele com a possibilidade de comprar uma cartola ou a satisfação de andar de lá para cá com um par de óculos de 3-D.

3. Baltimore é uma New Haven em escala gigante: uma ex-cidade industrial, com uma presença negra e pobre significativa e um sistema de segregação por bairros. É um Estados Unidos que o próprio país gostaria de ignorar. O método é familiar para qualquer brasileiro.

4. Pode-se escutar música de primeira na rua - uma banda de blues sensacional no mercado central daqui [Lexington Market, que já tem mais de 200 anos] me deixou arrepiado - e a comida é sensacional [crabcakes e pit beef] - sinal de que já estamos mesmo no Sul, a região sem a qual os Estados Unidos seriam o país mais chato da face da minha terra.


5. A melhor coisa que a televisão americana já vez que eu já vi foi uma série toda baseada em Baltimore: chama-se The Wire. Eis uma cena antológica: "In this country somebody's name's got to be in a piece of paper. [...] And here is the rub: you follow drugs, you get drug addicts and drug dealers; but you start following the money, you don't know what the fuck this is taking you."Quando eles finalmente começam a chegar às ligações entre o tráfico/venda e toda a gente rica da cidade, chega uma ordem lá de cima e a divisão montada por Lester e McNulty é desmantelada.

6. Nina Simone fez uma versão maravilhosa de uma canção que, em sua versão original [de Randy Newman] era um pouco exageradamente melodramática.

Baltimore
Randy Newman

Beat-up little seagull
On a marble stair
Tryin' to find the ocean
Lookin' everywhere

Hard times in the city
In a hard town by the sea
Ain't nowhere to run to
There ain't nothin' here for free

Hooker on the corner
Waiting for a train
Drunk lying on the sidewalk
Sleeping in the rain

And the people hide their faces
And they hide their eyes
'Cause the city's dyin'
And they don't know why

Oh, Baltimore
Ain't it hard just to live?
Oh, Baltimore
Ain't it hard just to live?
Just to live

Get my sister Sandy
And my little brother Ray
Buy a big old wagon
To haul us all away

Live out in the country
Where the mountain's high
Never gonna come back here
Till the day I die

Oh, Baltimore
Ain't it hard just to live?
Oh, Baltimore
Ain't it hard just to live?
Just to live




Eu confesso que conheci "Baltimore" muito antes de morar nos Estados Unidos, numa época em que, sem internet, eu vivia ávido procurando qualquer vinil, K-7 ou VHS  com qualquer coisa em que Robbie Shakespeare and Sly Dunbar tivessem se metido. Trombei então com essa versão do relativamente obscuro grupo The Tamlins:

Comments

Anonymous said…
1 - Quando li Notas do Subterrâneo eu tinha treze anos e pensei: "esse cara pensa igual a mim". rs.. Graças! Seu filho está salvo.
2 - Uma das lembranças mais saudosas que tenho do pai diz respeito às viagens que a gente fazia para pescar. Os motivos eram análogos ao que descreveu. Escutávamos Janis Joplin, invariavelmente.
Obs.: Estou tentando imaginar como seria escutar Dostoiévski dirigindo (ou mesmo viajando no banco do carona).
(Tata)
Anonymous said…
P.S.: Ainda mais se tratando de Notas do Subterrâneo, que é a mais "soco no estômago" de todas as obras dele.
(tata)

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