Nessas manifestações de entusiasmo pela campanha nas primárias americanas, acompanhada por uma certa indiferença pelas eleições municipais no Brasil, a gente vai também revelando a mesma inocência [ou será mesmo hipocrisia?] com que geralmente analisamos a vida política aqui ou lá. Vou me explicar melhor: o Brasil elegeu por duas vezes Lula com votações consagradoras [depositando nessas vitórias grandes esperanças de mudanças significativas] e, ao mesmo tempo, elegeu um congresso com clara maioria conservadora e fisiológica nas duas casas – basicamente o mesmo congresso com o qual FHC teve que governar. E depois ficamos todos decepcionados, reclamando por aí dos "conchavos" e "concessões" e "traições" ao projeto que o presidente da república representaria. Mas como governar com esse congresso sem concessões substanciais? Será que as tentativas de “cooptação” [leia-se: compra] de grupos descaradamente fisiológicos são fruto de mera vontade de perversão moral e “desejo obsessivo pelo poder”? Como seria um governo em que o PT tivesse um número de deputados no congresso proporcional aos de Lula? Esse voluntarismo grandiloqüente que imagina uma espécie de presidência imperial que resolve tudo por decreto só pode mesmo dar em amargura [hipócrita ou sincera]. E voltando aos Estados Unidos: que congresso e que judiciário vão acompanhar um hipótetico Obama presidente? Pouca gente parece disposta a reconhecer que a luta política não se restringe às eleições por cargos executivos e não acaba no dia da votação.
Monteiro Lobato conta em "O engraçado arrependido" a história trágica de um homem que não consegue se livrar do papel de palhaço da cidade, papel que interpretou com maestria durante 32 anos na sua cidade interiorana. Pontes é um artista, um gênio da comédia e por motives de espaço coloco aqui só o miolo da introdução em que o narrador descreve o ser humano como “o animal que ri” e descreve a arte do protagonista: "Em todos os gestos e modos, como no andar, no ler, no comer, nas ações mais triviais da vida, o raio do homem diferençava-se dos demais no sentido de amolecá-los prodigiosamente. E chegou a ponto de que escusava abrir a boca ou esboçar um gesto para que se torcesse em risos a humanidade. Bastava sua presença. Mal o avistavam, já as caras refloriam; se fazia um gesto, espirravam risos; se abria a boca, espigaitavam-se uns, outros afrouxavam os coses, terceiros desabotoavam os coletes. E se entreabria o bico, Nossa Senhora! eram cascalhadas, eram rinchavelhos, e...
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