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Poema meu


[imagem: cartão postal de 1905 do Luna Park de Long Island]

Mash-up: LUNA PARK

Nací cuando del sollozo del ultimo siglo,
No se oía ni un solo eco
Luis Cardoza y Aragón




O soluço do último século
abriu a fenda onde passaram
galopando as montanhas.

O século seguinte
ofereceu a Dom Quixote
um aeroplano,
lastre lançado ao passado.

Do trigo dos campos de batalha
um grão de loucura
germinou nas minhas entranhas.

O rio suicida me piscou um olho;
sua suave sonolenta corrente noturna
não quer os barcos que singram, fumando,
pacientes, sobre trilhos, no mar.

Nesse bosque de chaminés fumantes
escuto o músculo obediente,
fiel, sonoro, da máquina,
construindo castelos no ar.

Para as vidas sublinhadas
em vermelho pela guerra
o choro veste os rostos
com caretas de máscaras de clown:
o futuro é um feto que não vem.

E que Deus é esse
que só ouve súplicas em inglês?

Que prazer sentir-se bruto
e desfolhar a vida sem saber
nada da feira do mundo,
nada desse LUNA PARK
enorme, fantástico,
triste farsa universal!

Comments

sabina said…
adorei a penultima estrofe.
Não tenho o livro aqui comigo, mas Cardoza y Aragón diz num poema que os americanos todos têm 15 anos e acham que Deus um dia só responderá a súplicas em inglês.
Mais que o prédio a Sterling tem esses tesouros: um livrinho de um poeta Guatemalteco que viveu muito tempo em Paris e depois no México. O livrinho, dos anos 20 e bem no clima modernista, tem uma dedicatória autografada para o poeta americano Langston Hughes!
Mariana Botelho said…
o título Luna Park me remete à um poema da Adília Lopes. O poema em si, no entanto, não me remete à ela, mas à qualidade, à delícia do poema.
Qual poema da Adília Lopes?
Darlan M Cunha said…
Prezado Paulo da Luz Moreira,

cheguei aqui devido a leituras minhas minhas (nossas) de trabalhos do mexicano José Emilio Pacheco.

Parabenizo-o pela solidez, pela beleza e bom gosto do seu Blog.


Um abraço. Bom sábado.
Darlan M Cunha
Seja bem vindo, Darlan. Que bom saber que tem mais gente lendo José Emilio Pacheco no Brasil!

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