Skip to main content

Diário da Babilônia: Um pequeno conto sobre corrupção I

1. Em 2013 um senador estadual [sim, existem senados estaduais nos EUA] do partido democrata aventou a possibilidade de se candidatar a prefeito da Cidade de Nova Iorque pelo partido republicano. Para isso ele precisava do apoio de membros do Partido Republicano na cidade. Um envelope contendo 40 mil dólares em dinheiro foi entregue a um certo J. Hallorand III, vereador da "cidade" de Queens na cidade. Halloran serviu como intermediário para um contato com Vincent Tabone e Joseph Savino, que receberam respectivamente 50 e 75 mil dólares. O FBI estava monitorando toda a negociata usando um certo Moses Stern que, condenado a 450 anos de prisão, buscava reduzir sua pena.

2. Em abril de 2013 a notícia estourou e o governador do estado de Nova Iorque convocou a imprensa e anunciou a criação de uma comissão de 25 membros para investigar a corrupção política no estado, dizendo, "eles poderão investigar qualquer coisa que eles quiserem investigar; podem me investigar, investigar o promotor público, o chefe de finanças do estado, qualquer senador ou deputado."

3. A tal comissão convocou uma firma de consultoria política chamada "Buying Time" como parte das investigações, mas o próprio governador era cliente da tal firma e o governador simplesmente encerrou as atividades da tal comissão em março de 2014, menos de um ano depois. O caso chegou aos jornais e o governador, numa longa resposta por escrito, disse que "uma comissão formada pelo executivo do estado não pode investigar o executivo do estado."

4. No final de 2014, o governador foi reeleito com quase meio milhão de votos a mais que o segundo colocado. J. Halloran III alegou ser inocente e teve a tentativa de alegar insanidade mental negada, tendo sido condenado em primeira instância a 35 anos de prisão. Seus advogados estão recorrendo. Os advogados de Vincent Tabone acusaram o FBI de o terem induzido ao crime conseguiu assim interromper o primeiro julgamento, tendo sido este ano condenado a 5 anos por suborno. Seus advogados também estão recorrendo. Joseph Savino pagou uma fiança de 250 mil dólares e, em troca de uma pena menor, confessou o suborno.

Obs. Chamei essa história de "conto" pensando na idéia de Ricardo Piglia de que todo o conto conta duas histórias que se entrelaçam e se iluminam mutuamente.

Comments

Popular posts from this blog

Contos: "O engraçado arrependido" de Monteiro Lobato

Monteiro Lobato conta em "O engraçado arrependido" a história trágica de um homem que não consegue se livrar do papel de palhaço da cidade, papel que interpretou com maestria durante 32 anos na sua cidade interiorana. Pontes é um artista, um gênio da comédia e por motives de espaço coloco aqui só o miolo da introdução em que o narrador descreve o ser humano como “o animal que ri” e descreve a arte do protagonista: "Em todos os gestos e modos, como no andar, no ler, no comer, nas ações mais triviais da vida, o raio do homem diferençava-se dos demais no sentido de amolecá-los prodigiosamente. E chegou a ponto de que escusava abrir a boca ou esboçar um gesto para que se torcesse em risos a humanidade. Bastava sua presença. Mal o avistavam, já as caras refloriam; se fazia um gesto, espirravam risos; se abria a boca, espigaitavam-se uns, outros afrouxavam os coses, terceiros desabotoavam os coletes. E se entreabria o bico, Nossa Senhora! eram cascalhadas, eram rinchavelhos, e...

Poema meu: Saudades da Aldeia desde New Haven

Todas as cartas de amor são Ridículas. Álvaro Campos O Tietê é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia, mas o Tietê não é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia porque não corre minha aldeia. Poucos sabem para onde vai e donde vem o ribeirão da minha aldeia, 
 que pertence a menos gente 
 mas nem por isso é mais livre ou menos sujo. O ribeirão da minha aldeia 
 foi sepultado num túmulo de pedra para não ferir os olhos nem molhar os inventários da implacável boa gente da minha aldeia, mas, para aqueles que vêem em tudo o que lá não está, 
 a memória é o que há para além do riberão da minha aldeia e é a fortuna daqueles que a sabem encontrar. Não penso em mais nada na miséria desse inverno gelado estou agora de novo em pé sobre o ribeirão da minha aldeia.

Uma gota de fenomenologia

Esse texto é uma homenagem aos milhares de livrinhos fininhos que se propõem a explicar em 50 páginas qualquer coisa, do Marxismo ao machismo e de Bakhtin a Bakunin: Uma gota de fenomenologia Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele p...