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Showing posts from January, 2008

Já diziam os antigos:

Dinheiro, carinho e reza, ninguém despreza. A casa de má fama é onde gente séria entra mas não passa. Tem gente que é assim: guarda o passado em casa, em lugar fresco perto do pote, e vai buscar da rua outras raivas pequenas, tudo para ajuntar à massa-mãe do ódio grande, até chegar o dia de tirar vingança.

Herói

Herói Tudo nele é raso e nunca vai além da próxima esquina: rouba no preço, no peso, na nota, no frete, na engorda, na espera, pedindo um dia a mais, guardando um laço de fita debaixo do colchão, com água até o pescoço, gastando o sofá puído na frente da televisão: Tiraram a menina do buraco. Prenderam o assassino do banqueiro. Vai faltar cerveja no carnaval. Nasceu o bebê elefantinho. O mesmo verme que rói os ossos dele nos rói os ossos todos aos poucos também.

Morre a crítica ou faltam veículos para ela?

Vera Lins publicou um artigo muito interessante no Suplemento Literário do Minas Gerais que foi reproduzido na internet [http://www.digestivocultural.com/ensaios/ensaio.asp?codigo=229] O artigo fala sobre a arte da crítica e é também uma quase autópsia do ensaio crítico no jornalismo brasileiro. Abdicando do pensamento crítico e abraçando a entrevista e a reportagem promocional, surge o que o crítico Alcides Pécora chamou de "glosa da glosa": repete-se o que o artista disse para provar ao leitor que o artista é o que o artista disse. Mais ou menos como um cachorro que fica rodando, correndo atrás do rabo - e todos os livros e exposições e filmes sem excessão são sempre ótimos, é claro. A existência desse artigo, paradoxalmente, nega a inexistência de crítica no Brasil - felizmente. Mas o artigo toca no ponto mais sensível: o que não existe é o veículo que ofereça, com consistência e critério, um espaço para essa crítica encontrar-se com o leitor. O problema é eminente jorna...

Poesia Mexicana - Xavier Villaurrutia

Esse é mais um poeta mexicano menos conhecido do que merece fora do seu país: POESÍA Eres la compañía con quien hablo de pronto, a solas. Te forman las palabras que salen del silencio y del tanque de sueño en que me ahogo libre hasta despertar. Tu mano metálica endurece la prisa de mi mano y conduce la pluma que traza en el papel su litoral. Tu voz, hoz de eco es el rebote de mi voz en el muro, y en tu piel de espejo me estoy mirando mirarme por mil Argos, por mí largos segundos. Pero el menor ruido te ahuyenta y te veo salir por la puerta del libro o por el atlas del techo, por el tablero del piso, o la página del espejo, y me dejas sin más pulso ni voz y sin más cara, sin máscara como un hombre desnudo en medio de una calle de miradas.

O que queria dizer Joaquim Nabuco?

O que queria dizer Joaquim Nabuco? "Para nós a raça negra é um elemento de considerável importância nacional, estreitamente ligada por infinitas relações orgânicas à nossa constituição, parte integrante do povo brasileiro." [...] "Nós não somos um povo exclusivamente branco, e não devemos portanto admitir essa maldição da cor; pelo contrário, devemos tudo fazer por esquecê-la." Se tomássemos a frase isolada, um milhão de coisas." [...]

A convivência amigável entre pessoas de pontos de vista opostos

A convivência amigável entre pessoas de pontos de vista opostos costuma ficar muito difícil quando entra em jogo, de alguma forma, a luta pelo poder. Isso porque a luta pelo poder freqüentemente envolve o desejo de “eliminar” seus oponentes [desejo que toma feições tragicamente concretas em tempos de totalitarismo, quando o desejo de eliminar os oponentes de repente torna-se tentadoramente possível]. A luta pelo poder transforma rapidamente as convicções em dogmas e, primeiro esconde, depois elimina qualquer espaço para dúvidas e, conseqüentemente, para a crítica. Eliminadas todas as dúvidas, estamos prontos para fazer caricaturas grotescas de nossos “inimigos” e cobrir de tintas heróicas nossos “heróis”. Assim, para usar um exemplo recente, Chávez é, num passe de mágica, um ditador sanguinário e imbecil ou um herói revolucionário libertador. Chávez não é santo, nem uma nova encarnação do diabo. A verdade é claramente outra coisa, mas as pessoas que tentam manter o bom senso [dentro de...

Blogues sem jornais e blogues de jornais

Diz a propaganda do Estado de São Paulo que a diferença entre um blogue e um jornal na internet é que o primeiro é escrito sem qualquer tipo de “controle de qualidade” e por isso não é confiável, ao contrario do segundo. Mas olha que interessante o que se encontra nos blogues do próprio vetusto jornal: “As eleições americanas estão ainda mais agitadas do que se previa. Entre os pré-candidatos, meu ideal era ver uma disputa entre Barack Obama e Rudolph Giuliani. São os dois candidatos menos politicamente corretos ou previsíveis. Hillary Clinton é a cara do velho Partido Democrata, com sua ênfase num Estado mais protetor; Mike Huckabee e John McCain são os republicanos por essência, conservadores em questões morais e agressivos em política externa. Obama tem um discurso de união, que não faz proselitismo racial, mas esbarra no fato de não ter muita experiência administrativa. Giuliani, ex-democrata, é o preferido de regiões como Nova York, mas menosprezou as primárias em estados menores ...

Mote e glosa sobre jornalismo cultural

O mote: “Historicamente ligado à academia, o jornalismo cultural brasileiro durante muitas décadas foi feito exclusivamente de (e para) doutores, que utilizavam as páginas dos jornais para falar de suas teses a respeito de determinado autor ou livro. Para isso dispunham de espaço quase que ilimitado, totalmente fora dos padrões do jornalismo atual, onde o número de caracteres (toques) de cada texto é rigorosamente calculado e perde cada vez mais espaço para a publicidade. A linguagem acadêmica dos textos, por vezes hermética, era também um fator que afastava o leitor "comum" dos suplementos de cultura, tornando o espaço um nicho exclusivo de letrados. Símbolo de ruptura desse modelo, o caderno "Mais!", lançado em 1992 pela Folha de São Paulo, rompeu com o formato acadêmico dos suplementos, que desde os anos 1950 — época em que surgia a "Ilustrada" —, eram feitos exclusivamente por gente da academia. Produto direto da transformação gráfica e editorial empre...

Um conto/poema em prosa de Julio Torri

Esse é para fazer refletir quem acha que artifício e sinceridade são opostos perfeitos... O mal ator de suas emoções Julio Torri E ele chegou à montanha onde vivia o ancião. Seus pés estavam ensangüentados por causa das pedras no caminho e o brilho dos seus olhos manchado pelo desalento e pelo cansaço. - Senhor, sete anos se passaram desde que vim pedir-lhe conselho. Os varões dos mais remotos países louvavam sua santidade e sua sabedoria. Cheio de fé escutei as suas palavras: “ouve a teu próprio coração, e o amor que tenhas por teus irmãos não ocultes.” E desde então não encobria minhas paixões aos homens. Meu coração foi para eles como guia em águas claras. Mas a graça de Deus não desceu sobre mim. As mostras de amor que dei a meus irmãos, eles as tomaram por fingimento. E veja então como a solidão obscureceu o meu caminho. O ermitão o beijou três vezes na testa; um leve sorriso iluminou a sua face e ele disse: - Encobre o amor que tenhas a teus irmãos e dissimula tuas paixõ...

Resenha: Herdando uma bilbioteca – Miguel Sanches Neto

A importância da crônica na literatura brasileira não é fruto do acaso, muito menos de alguma afinidade natural entre a nossa cultura e o gênero. A crônica é tão presente entre nós porque os escritores brasileiros precisam complementar seus ganhos escrevendo para jornais e revistas. O gênero e a imprensa estão intimamente ligados desde quando o formato clássico da crônica consolidou-se nas páginas dos jornais no século XIX. As “Familiar Essays” Vitorianas, por exemplo, eram mais longas, mas já entremeavam reflexões e narrativas despretensiosas buscando a cumplicidade dos leitores com um tom informal e ameno de conversa entre amigos. Desse formato clássico vem uma impressão de facilidade que é enganosa. Pode não ser muito difícil produzir crônicas feitas na medida para sobreviver um dia ou semana até virarem forro de gaiola de passarinho, mas são poucos os cronistas que se alçam acima da média e realmente merecem uma edição posterior em livro. Esse é o caso de Miguel Sanches Neto: seu H...

Poesia Mexicana - Carlos Pellicer

Carlos Pellicer aprende a ser moderno com Tablada e trabalha como secretario Jose Vasconcelos [de Raza Cosmica]. Pellicer escreve muiuto sobre a luminosadade e o mundo concreto que ele admira e observa. Não é um poeta da subjetividade, mas também não é um poeta seco que recusa a subjetividade. E tem um grande domínio da língua, um prazer quase palpável com a linguagem. RECINTO ESTUDIOS I Relojes descompuestos, voluntarios caminos sobre la música del tiempo. Hora y veinte. Gracias a vuestro paso lento, llego a las citas mucho después y así me doy todo a las máquinas gigantescas y translúcidas del silencio. II Diez kilómetros sobre la vía de un tren retrasado. El paisaje crece dividido de telegramas. Las noticias van a tener tiempo de cambiar de camisa. La juventud se prolonga diez minutos, el ojo caza tres sonrisas. Kilo de panoramas pagado con el tiempo que se gana perdiendo. III Las horas se adelgazan; de una salen diez. Es el Trópico, prodigioso y funesto. Nadie sabe qué hora es. ...

Popularidade e Qualidade I

Tudo o que presta não tem popularidade; o que mobiliza corações e mentes das massas urbanas ou suburbanas empobrecidas ou remediadas é necessariamente uma porcaria. Paulo Coelho faz sucesso porque é ruim, mal escrito, superficial. Lavoura Arcaica não vende nem um centésimo porque é bom. Essa é uma equação elitista furada que não é furada porque é elitista; é furada porque qualidade e popularidade não estão relacionadas dessa maneira. Umberto Eco explica isso com muito mais clareza quando fala de pessoas que querem estar sempre contra a moda e terminam tão dirigidas pela moda quando os outros que a seguem fielmente. Popularidade e qualidade não estão relacionadas de maneira alguma e essa equação é mais uma das várias maneiras de escamotear a questão da qualidade, dar-lhe um parâmetro de julgamento muito mais fácil, já que aferir a popularidade de um programa de TV, livro, revista ou blogue é coisa simples de se fazer. Podemos debater dias e dias sobre quem é melhor poeta, Drummond ou Ca...

Teoria?

Teoria literária deveria sempre ser escrita em forma de poema CURTO [quanto mais curto melhor]. Melhor que prescrever é dar o exemplo: outro dia estava eu tomando uma xícara de chá admirando a paisagem gelada do inverno desse meu exílio voluntário quando vi passar pela neve suja da rua um espectro que identifiquei como - melhor não dizer aqui o seu nome ignóbil. Escrevi então em sua homenagem esse breve poema contemplativo: Uma máquina verbal que proíbe e sanciona e assim configura o possível.

Adendo

Um monte de gente detesta poesia hoje em dia, coisa que eu lamento. Mas eu nem acho que isso seja um sinal de qualquer coisa terr�vel, afinal me disseram outro dia que Mao Ts� Tung era um �timo poeta e Hitler parece que realmente gostava muito de Wagner. N�o custa dizer que essas coisas tamb�m n�o servem para denegrir a poesia ou Wagner. Gostar de poesia ou de literatura ou de pintura ou de qualquer forma de arte n�o salva ningu�m de nada, n�o faz ningu�m melhor que ningu�m. N�o � por a�. Quem quiser anunciar as artes como b�lsamos para o esp�rito a moda dos vitorianos que achavam que a “alta cultura” era a �ltima defesa contra as hostes b�rbaras saiba que est� vendendo gato por lebre.

Mensagens de ano novo

1. Para quem acha que estudar literatura é inútil eu cito o caso da contadora que denunciou as falcatruas da Enron nos EUA. Formada em literatura e contabilidade ela disse que foi a capacidade de leitura crítica que aprendeu em ciências humanas que a despertou para uma leitura mais desconfiada dos livros de contabilidade da quadrilha de Kenneth Lay. 2. Para quem simplesmente não gosta de poesia eu simplesmente digo: vocês não sabem o que estão perdendo. Há muita poesia horrível no mundo, eu confesso [poemas curtos horríveis são facéis de fazer, principalmente em comparação a um romance horrível, que por mais horrível que seja, leva meses de trabalho de datilografia]. Mas um bom poema é como um bom conto ou um bom romance e talvez até mais - você pode ler um bom livro de poesia em uma tarde e depois ficar relendo e repensando cada poema do livro o resto do ano. Mas poesia a gente deveria sempre ler em conjunto! 3. Para quem não gosta do Brasil: o Brasil está mesmo muito longe de ser uma...