Cecília Meireles é um pouco como Guimarães Rosa, uma grande artista brasileira que precisa ser resgatada de um equívoco crítico que vai se repetindo em um eco meio irrefletido e acaba tornando algo aparente e claro em um mistério que ninguém vê. O poema abaixo é exemplo de que Cecília não é essa passadista meio morna que os manuais escolares de literatura querem projetar. O cavalo desse contundente poema faz companhia na minha imaginação ao cavalo morto de um romance de Faulkner [As I Lay Dying], aos cavalos mortos do filme de Buñuel & Dalí [Le chien andalou] e ao terrível genocídio eqüino de Grande Sertão: Veredas . O cavalo morto Vi a névoa da madrugada deslizar seus gestos de prata, mover densidades de opala naquele pórtico de sono. Na fronteira havia um cavalo morto. Grãos de cristal rolavam pelo seu flanco nítido; e algum vento torcia-lhes as crinas, pequeno, leve arabesco, triste adorno, - e movia a cauda ao cavalo morto. As estrelas ainda viviam e ainda não eram nascidas ah...
Basicamente, mas não exclusivamente literatura: prosa e poesia.