Skip to main content

Jóias da Literatura Americana: Flannery O'Connor


Flannery O'Connor é uma das escritoras mais originais que eu já li - uma católica praticante que adorava o grotesco e foi uma das figuras mais importantes do Southern Gothic. Junto com Katherine Anne Porter, Eudora Welty, Carson McCullers [todas do sul dos Estados Unidos], acho que O'Connor escreveu a melhor literatura americana do século XX, depois de Faulkner. É dela o elenco mais estranho e fascinante de personagens que eu já conheci: uma perneta niilista formada em filosofia chamada Joy Hopewell, um vendedor de bíblias que esconde pornografia e bebida em uma Bíblia oca, etc.
O'Connor é uma escritora de precisão, com uma frieza e crueldade extremas que nunca caem na banalidade, uma lição útil para muito escritor contemporâneo que quer bancar o Tarantino no papel e acaba escrevendo neo-naturalismo de quinta.
Abaixo um trecho do conto "A Good Man is Hard to Find", com o confronto final entre uma vovó mal humorada e o assassino The Misfit, que acaba de dar cabo de toda a família da velha.

Alone with The Misfit, the grandmother found that she had lost her voice. There was not a cloud in the sky nor any sun. There was nothing around her but woods. She wanted to tell him that he must pray. She opened and closed her mouth several times before anything came out. Finally she found herself saying, "Jesus. Jesus," meaning, Jesus will help you, but the way she was saying it, it sounded as if she might be cursing.

"Yes'm," The Misfit said as if he agreed. "Jesus shown everything off balance. It was the same case with Him as with me except He hadn't committed any crime and they could prove I had committed one because they had the papers on me. Of course," he said, "they never shown me my papers. That's why I sign myself now. I said long ago, you get you a signature and sign everything you do and keep a copy of it. Then you'll know what you done and you can hold up the crime to the punishment and see do they match and in the end you'll have something to prove you ain't been treated right. I call myself The Misfit," he said, "because I can't make what all I done wrong fit what all I gone through in punishment."

There was a piercing scream from the woods, followed closely by a pistol report. "Does it seem right to you, lady, that one is punished a heap and another ain't punished at all?"

"Jesus!" the old lady cried. "You've got good blood! I know you wouldn't shoot a lady! I know you come from nice people! Pray! Jesus, you ought not to shoot a lady. I'll give you all the money I've got!"

"Lady," The Misfit said, looking beyond her far into the woods, "there never was a body that give the undertaker a tip."

There were two more pistol reports and the grandmother raised her head like a parched old turkey hen crying for water and called, "Bailey Boy, Bailey Boy!" as if her heart would break.

"Jesus was the only One that ever raised the dead," The Misfit continued, "and He shouldn't have done it. He shown everything off balance. If He did what He said, then it's nothing for you to do but thow away everything and follow Him, and if He didn't, then it's nothing for you to do but enjoy the few minutes you got left the best way you can by killing somebody or burning down his house or doing some other meanness to him. No pleasure but meanness," he said and his voice had become almost a snarl.

Comments

já ouvi vários elogios a ela; mas ao mesmo tempo me assusta.
Acho que Flannery O'Connor assusta nao pela violencia, mas porque ela eh uma escritora com um senso de humor muito apurado e tem um controle emocional da voz narrativa muito grde - ela nao eh indiferente mas tbm nao se deixar levar pelas emoçoes nos momentos pesados.
Unknown said…
Ao lado de Flannery O’Connor, François Mauriac, Paul Claudel e Walker Percy, o francês Georges Bernanos figura entre os grandes escritores cristãos do século XX, ao ponto de o grande teólogo alemão Hans Urs von Balthasar ter-lhe dedicado um livro inteiro. Sua obra tem sido publicada no Brasil pela É Realizações Editora, e agora sua passagem pelo país é narrada ao público local. O estudo de Sébastien Lapaque “Sob o Sol do Exílio: Georges Bernanos no Brasil (1938-1945)” acaba de ser publicado, trazendo à luz a visita de Bernanos a várias cidade do Rio de Janeiro e Minas Gerais, sua estadia no sítio Cruz das Almas, sua revolta contra a mediocridade dos intelectuais e a ascensão do totalitarismo, sua amizade com pensadores brasileiros e a visita que Stefan Zweig lhe fez à véspera de se suicidar.

Matérias na Folha de S. Paulo a propósito do lançamento do livro: http://goo.gl/O8iFve e http://goo.gl/ymS4lL
Para ler algumas páginas de “Sob o Sol do Exílio”: http://goo.gl/6hAEOM

Confira também:
Diálogos das Carmelitas: http://goo.gl/Yy3ir3
Joana, Relapsa e Santa: http://goo.gl/CAzTTk
Um Sonho Ruim: http://goo.gl/Kd091z
Diário de um Pároco de Aldeia: http://goo.gl/ISErLc
Sob o Sol de Satã: http://goo.gl/qo18Uu
Nova História de Mouchette: http://goo.gl/BjXsgm

ANDRÉ GOMES QUIRINO
mkt1@erealizacoes.com.br
(11) 5572-5363 (r. 230)

Popular posts from this blog

Contos: "O engraçado arrependido" de Monteiro Lobato

Monteiro Lobato conta em "O engraçado arrependido" a história trágica de um homem que não consegue se livrar do papel de palhaço da cidade, papel que interpretou com maestria durante 32 anos na sua cidade interiorana. Pontes é um artista, um gênio da comédia e por motives de espaço coloco aqui só o miolo da introdução em que o narrador descreve o ser humano como “o animal que ri” e descreve a arte do protagonista: "Em todos os gestos e modos, como no andar, no ler, no comer, nas ações mais triviais da vida, o raio do homem diferençava-se dos demais no sentido de amolecá-los prodigiosamente. E chegou a ponto de que escusava abrir a boca ou esboçar um gesto para que se torcesse em risos a humanidade. Bastava sua presença. Mal o avistavam, já as caras refloriam; se fazia um gesto, espirravam risos; se abria a boca, espigaitavam-se uns, outros afrouxavam os coses, terceiros desabotoavam os coletes. E se entreabria o bico, Nossa Senhora! eram cascalhadas, eram rinchavelhos, e...

Poema meu: Saudades da Aldeia desde New Haven

Todas as cartas de amor são Ridículas. Álvaro Campos O Tietê é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia, mas o Tietê não é mais sujo que o ribeirão que corre minha aldeia porque não corre minha aldeia. Poucos sabem para onde vai e donde vem o ribeirão da minha aldeia, 
 que pertence a menos gente 
 mas nem por isso é mais livre ou menos sujo. O ribeirão da minha aldeia 
 foi sepultado num túmulo de pedra para não ferir os olhos nem molhar os inventários da implacável boa gente da minha aldeia, mas, para aqueles que vêem em tudo o que lá não está, 
 a memória é o que há para além do riberão da minha aldeia e é a fortuna daqueles que a sabem encontrar. Não penso em mais nada na miséria desse inverno gelado estou agora de novo em pé sobre o ribeirão da minha aldeia.

Uma gota de fenomenologia

Esse texto é uma homenagem aos milhares de livrinhos fininhos que se propõem a explicar em 50 páginas qualquer coisa, do Marxismo ao machismo e de Bakhtin a Bakunin: Uma gota de fenomenologia Uma coisa é a coisa que a gente vive nos ossos, nos nervos, na carne e na pele; aquilo que chega e esfria ou esquenta o sangue do caboclo. Outra coisa bem outra é assistir essa mesma coisa, mais ou menos de longe. Nem a mãe de um caboclo que passa fome sabe o que é passar fome do jeito que o caboclo que passa fome sabe. A mãe sabe outra coisa, que é o que é ser mãe de um caboclo que passa fome. Isso nem o caboclo sabe: o que ela sabe é dela só, diferente do caboclo e diferente do médico que recebe o tal caboclo e a mãe dele no hospital. O médico sabe da fome do cabloco de um outro jeito porque ele já ficou mais longe daquela fome um tanto mais que a mãe e outro tanto bem mais que o caboclo. O jeito que o médico sabe da fome daquele caboclo pode ser mais ou menos só dele ainda, mas isso só se ele p...