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Poesia minha: Vozes do além túmulo

No primeiro conto que eu escrevi [e continuo re-escrevendo até hoje] o protagonista, num momento de extremo desespero moral e desconforto físico, tinha uma visão onde aparecia o avô morto que falava assim com ele:

Depois de ter vivido tanto é que eu vi
que não vivi nada,
que fui vivido pelo tempo
que nunca teve dó de mim,
que nunca me fez nem um sinal,
que nunca nem me viu.
Cada palavra que saiu da minha boca
foi areia caindo em cima de areia;
todo esse movimento estúrdio,
em que o santo sobe e desce
e o cavalo permanece –
visto agora aqui de fora –
é feito um cachorro correndo
atrás do próprio rabo,
rodando, rodando, sem cansar;
é feito o mar que sobe e desce
e se estira na praia
ou bate dia e noite na pedra dura
e mesmo assim não sai nunca do lugar.
Não guardo mágoa
porque o pobre tempo de uma vida,
mesmo a vida mais bonita e mais comprida,
não é nem um cisco no olho do tempo todo do mundo;
ainda que esse tempo todo do mundo,
esse monstro de pedra
plantado dentro e fora de tudo,
seja feito assim: cisco
atrás de cisco atrás de cisco.
Só depois de ser vivido
pela minha vida inteira é que eu vi
e tudo isso que eu vivi
ainda me custa estar morrendo até agora.

Comments

"areia caindo em cima de areia"

Seus poemas possuem metaforas lindas.
Gosto muito, de tudo isso...
"METAFORAS SÃO RESULTADO DO TEMPO."
Obrigado, Fernanda. O curioso eh que sem querer acabei vendo que os dois ultimos poemas tem a ver... Essa perspectiva distante, distante, fazendo as coisas aqui agora parecerem pequenas e desimportantes.

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