Ilustração: "Mecanismo" de Letícia Galizzi Nós vamos afundar Nós vamos afundar devagar até o fundo da garrafa e lá vamos nos encontrar transformados em bestas de corpo fosforescente, criaturas vivendo sem luz, no fundo mais fundo, submersos no lodo, sem olhos para abrir e ver, só um par de antenas cravadas no couro velho e duro. E, no momento mais agudo, esses monstros lá de baixo vão nos mastigar devagar e, como nossas irmãs as hienas, vão nos enterrar na areia e voltar para comer o resto mais tarde. Mas um corpo morto é um copo deitado, não segura mais nada; aberto para o mundo, não se fecha nunca mais. Ah, nós vamos afundar devagar, e vai ser bom demais. Porque lá no fundo a felicidade vai estar nos esperando com a boca aberta, macia, sem dentes, pronta para nos engolir sem mastigar. Ah, vai ser bom de...
Basicamente, mas não exclusivamente literatura: prosa e poesia.